Rabos, quatros, braços, dados...
E Chico Buarque esteve em
cena duas vezes durante o dia. Seu circo místico deu vida à trilha de dois
espetáculos. O texto Os Saltimbancos,
tem uma essência tão política, que dificilmente se pode negar o que realmente
os quatro amigos inspirados nos cantores de Bremen vieram fazer no palco.
Trabalhadores braçais, domésticas, artistas e soldados, são a essência de um
dos musicais mais montados no Brasil, porém Cléber Lorenzoni usa o enredo para um
objetivo menor. Claro que a nível de mensagem subliminar, não há como o público
não guardar frases, e impressões lá no fundo da mente... “Sou um pobre Pau de
arara...” “Hoje todo mundo canta, como dizem aqueles que não sabem cantar” ”Nós
artistas nascemos livres...”
O objetivo do Máschara,
no entanto, é levar arte ao público, colocar a criança sentada na frente do
palco e oferecer a ela algo novo, algo que ela nunca viu. Bons ou razoáveis
atores, a poucos metros, saltando, cantando, dublando, dançando, expressando-se...
Algo que a russa Natalia Satz já havia proposto em 1918 no Teatro para Crianças
de Moscou e que pipocou pelo mundo em meados do século XX. O objetivo? Preparar
plateias?
O adulto de hoje, que
quase não vai ao teatro, gostou da ideia de oferecer teatro ao filho, ao aluno,
ao sobrinho... Assim ele tira de seus ombros a necessidade de ir a um
espetáculo. A criança irá! Mas há um belo ditado: Se queres alfabetizar uma
criança, comece por sua avó... Ou seja, a criança que vai ao teatro hoje,
poderá influenciar as próximas gerações. A pergunta que fica é: haverá atores
daqui algumas gerações? O teatro florescerá, ou estamos a caminho do fim dessa
arte?
Luzes, tablado, som,
improviso, alguns metros de tecido, e voilà! A arte acontece. Não ouvi
quase nada. Já conheço, mas me coloco no lugar das crianças, que em um momento importante
de alfabetização precisam compreender o que é dito. Ao mesmo tempo e me contrariando,
não dá para negar as impressões visuais, as sensações, o feeling. Um
elenco coeso, formado por Renato Casagrande, Alessandra Souza, Cléber Lorenzoni
e Nicolas Miranda, esse último estreando e com desenvoltura de personagem
maduro. Mérito também da partitura que a personagem já traz de Renato
Casagrande. Mas Nicolas atua a altura dos artistas mais velhos, alguma dublagem
perdida, o que na bagunça de uma sonorização parca, não chega a destoar.
Jogo de cena perfeito.
Alessandra Souza retorna ao palco para nos dar mais um gostinho de sua atuação,
talvez antes de despedir-se totalmente do teatro do Máschara. Bons quatorze
anos de uma vida dedicada ao palco. Cléber Lorenzoni inteiro, e generoso com
colegas e plateia. Abre mão com muita tranquilidade da coreografia que é apenas
artifício para aproximar-se e pegar o público.
Renato Casagrande, comanda
a “festa” e é preciso saber carregar um elenco. Tarefa que o primeiro ator de um
espetáculo precisa assumir com muita generosidade, humildade e entrega. É ele
que dita o ritmo, que guia e apoia as peças do xadrez teatral. Os saltimbancos
é um encanto e me surpreendi vendo a forma como a gata foi ovacionada, ainda
que muitos olhares fossem de confusão, já que as questões de gêneros ainda sejam
grandes tabus, sobretudo em cidades pequenas.
Não vou falar de roteiro
e adaptações, mas seria interessante um longo estudo do tema.
Na contra-regragem,
Laura Heger, Fabio Novello e uma grande equipe de apoio. Tão necessária no
teatro precário e sofrido que se faz no interior. Laura Heger vem se mostrando
uma “grande”, disposta a todas as proposições do mise em scène. Torçamos
que faça da vida do palco, sua profissão por muito tempo. O público merece sua
verdade, sua arte.
Para encerrar, meu
aplauso de admiração, só um grupo de repertório muito organizado, para em uma
semana subir ao palco com as peripécias do Cristo Bíblico, estrear um ator em
um musical infantil, ainda que dublado e readaptar um espetáculo cheio de
estrelas como o Grande Circo Mágico.
Arte
é Vida
A Rainha
Cléber
Lorenzoni
Renato
Casagrande
Alessandra
Souza
Nicolas
Miranda (***)
Laura
Heger (***)
Fabio
Novello
Grande
equipe
P.S:
Ontem o diretor me avisou que eu havia esquecido de mencionar um dos atores de
O Grande Circo Mágico. Parabéns Romeu Waier, é sempre um privilégio ver tua
chama viva em cena.
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