Entrevista com Cléber Lorenzoni, feita por esta crítica de teatro...




Então vocês acabam de estrear Os Saltimbancos de Chico Buarque. Como foi o processo? Como se sentiram, e quais as expectativas para o futuro?

As expectativas são as melhores... Apresentar muito... Fechar o ciclo! As musicas são lindas, são de Chico Buarque e Sergio Bardotti e nos emociona muito fazê-lo, afinal há muitos anos tínhamos essa talante. Fomos estrear agora em Bento Gonçalves, para um público muito legal, em plena 27ª Feira de Livros. O processo foi maravilhoso e exaustivo, bem ao estilo Máschara de fazer teatro. Muitos ensaios, pesquisa corporal, construção há várias mãos. Aliás, esse espetáculo que estreou aqui em Bento Gonçalves, começou a ser construído, concebido, em 2003, com outra formação de elenco. E todos eles colaboraram de alguma forma, afinal como tu sabes, essas criações ficam todas codificadas em nossas mentes, memorizadas por muito tempo. Na época Lauanda Varone faria a Gata, que agora é interpretada por mim, Rafael Aranha faria a galinha, e Alexandre Dill faria o cão e eu o Jumento. Mais tarde em 2009, Roberta Correa e Angélica Ertel também abraçaram a idéia, mas não vingou. Sei lá, são os deuses do teatro que decidem essas coisas... Talvez não fosse o momento, mas claro, ficou-nos muita coisa dessas tentativas e que agora aparecem na cena.

E quem são os envolvidos agora? Como tu escolheste o elenco?
Para grupos do interior não há muito o que escolher, afinal tu vais trabalhando com quem está ali afim. No elenco somos eu, Gabriel Wink que é um ator muito criativo, muito intuitivo e que faz o Jumento. Alessandra Souza, uma atriz que está aos poucos se revelando um grande intérprete e que faz a Galinha. Há também Renato Casagrande que é um jovem muito dedicado e desafiador no papel do cão. Na direção somos eu Dulce Jorge. Na contra-regragem e responsável pela execução da sonoplastia tenho Gabriela Varone, que é natural de Julio de Castilhos e que vem se adaptando muito bem ao grupo e é claro contamos com o apoio de vários outros colegas que nos ajudam a por tudo em cena. Mas queríamos um elenco pequeno, fácil de reunir, de trabalhar. Por isso apenas quatro atores. Renato Casagrande tinha que ser o cachorrinho, seu crescimento é visível, vai ser com certeza um grande ator. Gabriel Wink era nossa melhor opção para o Jumento, afinal tem quase seis anos de palco, um bom trabalho corporal. Alessandra Souza também tem sido uma companheira de lutas e provou estar a altura do papel.

Tu sempre dirigiste os espetáculos do Máschara, e também fostes o primeiro papel, agora divides a direção com Dulce Jorge e entregas o papel principal a Gabriel Wink, por que, estás começando a cansar?

Na verdade em As Balzaquianas(2011) eu e Angélica Ertel dirigimos juntos, e em A Maldição do Vale Negro(2009) Dulce Jorge dirigiu ao meu lado. É uma questão de idéia, de inspiração, da situação atual. Acho que também há o interesse em dividir algo. Algo que se quer muito. E a Dulce Jorge é minha irmã de alma, de gostos teatrais. São anos cirando, compondo, idealizando juntos. Então na verdade tudo o que dirijo tem a assinatura dela também. Quanto ao papel principal, durante anos tive que ser a cara dos espetáculos, mas também por uma questão de disponibilidade. Eu vivo inteiramente para o teatro, para o Máschara. Posso dedicar 24 horas por dia para a cena. Então isso me da uma confiança em mim mesmo.Mas claro que depois de tempos trabalhando com Gabriel Wink, e já que eu queria fazer o papel da gata, decidimos que ele deveria assumir o primeiro papel. Mas não vou mentir que não tive milhões de receios. Sou libriano, indeciso sempre.
E como é dirigir um grupo de jovens artistas?
Não é fácil e não é de todo difícil. Diretor tem que ser meio psicólogo, meio conselheiro. Tem que ser muito político. Gabriel Wink é um ator de muita personalidade. Ele sabe o que quer fazer no palco. Renato Casagrande é o tipo de ator que te desperta a vontade de desafiá-lo. Alessandra Souza tem algumas dificuldades, e aos poucos vem revelando muita independência. Por tanto tu não podes chegar mandando, tu precisas absorver muito dos atores. Afinal eles tem muito a dar.
Tu me surpreendes, até pouco tempo atrás pensava que tu preferias trabalhar com atores que omitissem seu ponto de vista e apenas cumprissem sua vontade cênica, como Charles Chaplin...
Sim, sim, mas acho que isso tem haver com amadurecimento. Agora é mais vivaz, mais prazeroso saber o que os atores tem para ofertar à cena. Por exemplo, com Renato Casagrande fazendo o cachorro e eu a gata, é uma festa, criamos muito juntos. Enfim dirigir é muito complexo.

E por que Saltimbancos?
Saltimbancos é um clássico do teatro. Foi escrito em plena ditadura e seu texto está repleto de críticas a política e ao regime da época. Mas não é texto morto, embora pareça muito datado. Quase todo mundo já montou ou vai montar e meu preconceito para com esse texto era enorme e paradoxal. Mas ele me toca em dois aspectos. Ele fala de união e de diversidade. Não gosto de falar em mensagem do espetáculo, penso que isso é mastigar o texto, a idéia, no entanto é indiscutível a força com que Chico representou a premissa de que a união faz a força. Em O Conto da Carrocinha (1999) havíamos discutido a fábula de O patinho feio, não me convencia a idéia de que O “patinho-cisne” precisasse viver com seus iguais para viver feliz. E por isso ele não quis ficar nem com os Cisnes nem com os “Patos”. Quis viver com alguém que simplesmente era outro ser. A diversidade está aí, presente nos chocando, nos questionando e é hora sim de falar disso. Tenho a pretensão de mudar o mundo, não no quesito para melhor ou para pior, quero virá-lo de ponta cabeça ao menos. Em uma cena maravilhosa de A Dama de Ferro com Meryl Streep, a atriz, intepretando Margareth Teacher, comenta que as pessoas sentem demais e pensam de menos. Talvez por isso haja cada vez mais depressivos e burros no mundo.
E desse ano eleitoral, o que espera para o teatro para as artes?
Que se os políticos não forem ajudar que ao menos não atrapalhem. Eles passam a arte fica!

                                          Bento Gonçalves 14 de Maio de 2012

                                                 A Rainha e Cléber Lorenzoni

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