Tournê A Maldição do Vale Negro no Cena às 7


São nove horas da manhã, e estou ansiosa, hoje tem teatro... Amo teatro e a mim agradaria que houvesse espetáculos todos os dias, mas compreendo que aqui no interior isso é algo utópico. No entanto não posso negar que as coisas vão muito bem, afinal esse mês Cruz Alta foi presenteada com muitas inserções cênicas: Homens de Perto, Hospício Pop Rock, Maldição do Vale Negro e ainda Teatro Biriba. À parte pontos de vistas, méritos e talentos, quem ganha é a cidade, o público! Quem disser que Cruz Alta não oferece divertimentos e opções de lazer é deveras impertinente.
De todas essas opções vou me ater àquela que me cabe nesse espaço. O Cena às 7. Primeiro por que conheço profundamente o trabalho desse grupo, segundo por que de todos os citados são os únicos naturalmente “crias” da cidade. O Cena às 7 agora passa a ser em dois dias por mês, mais uma opção para o público de teatro de nossa cidade, público esse que vem crescendo a cada dia. A historia do Cena às 7 é a historia de um sonho, por isso não se sabe bem quando começou. Cléber Lorenzoni e Thiago Amorim (Abambaé) viveram esse sonho, idealizaram-no em 2005. Desse momento em diante o sonho passou a ser de várias pessoas que amam o público, amam as artes, amam o que fazem sem saber por que, sem demagogias pode-se dizer que apenas por um ideal. Se na verdade não são sete como diante de Tebas, nem por isso deixam de ter uma historia. É um pouco da historia desse ideal que é contada nesse texto. Historia essa que possui os ingredientes de esperança e os atos de coragem sem os quais qualquer ideal fica comprometido.
Embora Cléber Lorenzoni algumas vezes tenha se embrenhado pelo mundo da dança e Thiago Amorim tenha se enveredado pelo mundo do teatro, ambos nasceram provavelmente o primeiro para o teatro e o segundo para a dança, suas versatilidades no campo um do outro, provêm obviamente de suas sensibilidades extremas e capazes. Foi em uma conversa de cafezinho, essas que os artistas e os boêmios costumam ter que para leigos parece não levar a lugar nenhum, mas nas quais certamente os atristas criam loucamente, que tiveram a ideia de fazer algo no palco da casa de cultura, algo para a plateia da cidade, algo que viesse para ficar. Na conversa estavam presentes a baliranina Jaciara Jorge e o ator Rafael Aranha, e se não me engano o também bailarino Igor Pretto. No final da conversa estava rascunhado o Cena às 7.
Em 04 de outubro de 2005 era lançado oficialmente o Cena às 7, na presença de várias presenças ilustres de nossa sociedade, além dos bailarinos do Abambaé e atores do Máschara. Em 9 de outubro subiu ao palco o primeiro Cena às 7 com o espetáculo Tartufo prelúdio artístico apresentado por jovens bailarinas. Nesse primeiro ano foram três espetáculos teatrais e dois espetáculos de dança.
2006 iniciou com mais dois espetáculos teatrais e três de dança. Logo depois, infelizmente a dança retirou-se do Cena às 7, o motivo era simples, criar e produzir espetáculos no interior não é tarefa fácil. O Máschara forçou-se a continuar mas as coisas não foram fáceis, sem apoio e somente com o dinheiro dos ingressos o projeto parecia com os dias contados.
Em 2007 nascia a produtora Script produções e começavam a surgir os primeiros patrocinadores e apoiadores. Ponto do Livro, Vencal Calçados, Lojas Becker, Espaço do Corpo, Cooplantio, Linke Supermercados, Sultec Celulares, Grafit, Café de Minas, Postos 2001, Lorena e Alcides Cabeleireiros, Clube Um, Viapex, Ópticas Orion, Xôck’s, Tejedor, Pampa Turismo e Casa das Linhas.  Durante os sete anos de Cenas às 7, foram apresentados treze espetáculos teatrais e três espetáculos de dança e um de dança e teatro(Romeu e Julieta) em 46 edições de cena ás 7. Envolvendo mais de oitenta artistas, entre bailarinos, atores, técnicos, cenógrafos e etc...
Ontem, dia 21 de abril de 2012, Cléber Lorenzoni, Dulce Jorge e Ricardo Fenner ousaram dar mais um paço em direção as melhorias do teatro na cidade, aumentado o programa de teatro para dois dias no mês. Talvez por isso mesmo a  noite tinha cara de estreia. No palco A Maldição do Vale Negro, já apresentada no Cena às 7 em maio e junho de 2009, em junho de 2010, em julho de 2011 e agora. 
Sob direção de Cléber Lorenzoni com direção de elenco de Dulce Jorge e direção de palco de Angélica Ertel, tendo como técnicos de som e luz, a novata Gabriela Varone(**) e o já conhecido Luis Fernando Lara(*). No palco Cléber Lorenzoni (**), Gabriel Wink(**) e Ricardo Fenner(***), e contra-regragem afiadíssima de Alessandra Souza(*) e Renato Casagrande(**).
A Maldição do Vale Negro é um dos cinco espetáculos mais importantes da Cia. Um exercício perfeito para os atores em cena, uma comédia divertidíssima que envolve crianças e adultos. Na noite de sábado embora não estivesse totalmente afiada, a peça arrancou boas risadas da plateia que no final aplaudiu em pé os quase noventa minutos de espetáculo. Ricardo Fenner deu um show de interpretação com O velho conde Mauricio de Belmont e a cigana Jezebel, pode ainda controlar um pouco mais sua energia, lembrando sempre que energia não quer dizer gritaria e ritmo não quer dizer velocidade.  Gabriel Wink jogou impecavelmente nas cenas de Vassili, um de seus melhores personagens certamente. A governanta Ágatha que para mim é o segundo papel do espetáculo poderia estar mais afinada, cortante, bem acabada. Faltou provavelmente ensaio. Aconselho ao ator não esquecer que apesar de ser uma bela estrela do palco, ainda é um ser humano, com corpo, e que o corpo é uma máquina que precisa de treino, de exercícios e de cuidados. Cléber Lorenzoni como protagonista pontua todas as cenas, ergue várias bolas e ajuda a marcar gols, como ator generoso que é, mas poderia deleitar-se mais em sua condessa, que aliás, é um divertimento a parte para as crianças.
A noite definitivamente não foi da equipe de apoio. Algumas pessoas não compreendem que iluminadores e sonoplastas são figuras de extrema importância e que eles dão o tom do espetáculo com sonoplastia e iluminação apuradas.  Nesse tipo de espetáculo boa parte das impressões cômicas são dadas através de pequenas e rápidas inserções sonoras que se não entrarem no momento exato podem destruir a sequencia da narrativa. A Maldição do Vale Negro tem, pontuando a historia, um narrador, e quando partes da narração não são bem ouvidas, o público pode perder o interesse e em um espetáculo tudo tem que correr para prender o interesse do público e não o contrário. A iluminação confere beleza aos olhos, arte a mente e sinaliza cenas, narrações e piadas, como então deleitar-se quando blecautes confundem a compreensão dos códigos visuais?
Um espetáculo como A Maldição do Vale Negro tem que ser cuidado para que depois de anos ainda possa render lucros, aplausos e prazeres. Então nada de relaxamento, nada de atores esticando cenas, acrescentando piadas que formam barrigas, contra-regras relaxando em suas funções, palcos cheios de adereços e pedaços de figurinos, ou vozes baixas.
A Dulce Jorge um último elogio nessa página, não sei se as pessoas tem essa compreensão, mas graças a essa jovem outrora tímida que tanto quis criar um grupo de teatro há vinte anos atrás, temos agora o Máschara e o Cena às 7. Que essa jovem atriz não esqueça nunca que seu nome está para sempre marcado nas pedras da historia da nossa terra e nas linhas maravilhosas da arte.
Agora vou descansar pois hoje a noite tem teatro na terra da panelinha. Parabéns a todos os que fazem o Cena às 7 e coragem, dias difíceis virão! 


                                                                                                                     
                                                                      A Rainha

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