quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Stella Bento- Sobre Rei Lixo em Rosário do Sul

 

FESTIVAL INTERNACIONAL DE TEATRO ROSÁRIO EM CENA 24ª EDIÇÃO

25 de outubro a 01 de novembro de 2025

Teatro Municipal João Pessoa – Rosário do Sul/RS

 

 

REI LIXO – TRANSCRIAÇÃO DA OBRA REI LEAR

 

         O reconhecido Grupo Maschara, de Cruz Alta, esteve presente no Rosário em Cena com sua obra mais recente, “Rei Lixo”, uma Transcriação da obra “Rei Lear”, de Shakespeare. O enorme desafio, de trabalhar com uma peça de Shakespeare se torna ainda maior pela complexidade desse texto.

         Rei Lear é a peça em que um velho rei decide partilhar seu reino entre suas três filhas e faz essa divisão depender de uma declaração de afeto de cada uma delas. As mais velhas Goneril e Regan entoam palavras exageradas e bajuladoras, enquanto a mais nova, Cordélia, expressa seu amor filial com simplicidade e verdade. A vaidade de Lear – que prefere as bajulações de Goneril e Regan às palavras simples e sinceras de Cordélia – desencadeia uma série de desgraças e violências. As filhas bajuladoras recebem suas partes no reino e a filha amorosa é banida. O erro custa caro ao velho rei que é abandonado pelas filhas a quem confiou seus domínios e apenas a filha desprezada vem em seu auxílio. Há também a história paralela de Gloucester, onde o filho ilegítimo, Edmund, tenta enganar o filho legítimo, Edgar, para tirar sua herança. Outra presença marcante é o bobo da corte, que diz o ninguém mais ousaria. Guerras e assassinatos se sucedem até um final trágico.

         Kleber Lorenzoni é o responsável pela transcriação do texto de “Rei Lear” para “Rei Lixo”. Ele também dirige o espetáculo e atua como o personagem-título.

         A transcriação feita por Kleber Lorenzoni foi profunda, resultando num espetáculo ao mesmo tempo fiel e transgressor em relação ao original. Transgressor por substituir o contexto do texto original da realeza para um lugar de miséria e lixo; onde o que se divide são objetos de descarte e restos.  

         Fiel, porque as falas, características e objetivos dos personagens, o desenrolar da trama, os conflitos, as lutas fratricidas por poder e grandeza e a arrogância que cega se mantêm nessa adaptação.

         Kleber resumiu bastante o texto, mas manteve a espinha dorsal da trama e ela continua perfeitamente compreensível. Houve uma troca entre os personagens Edmundo e Edgar. Nessa versão, o filho ilegítimo Edmund é leal ao pai, e Edgar é o filho conspirador.

         Todo o elenco está parelho, com ótimas atuações. A interpretação de Kleber Lorenzoni é destaque. As difíceis falas de Lear soam claras, com emoção e intenção.

         Figurino, cenário, iluminação, tudo está bem-acabado e funcional.

         A meu ver, o único problema do espetáculo é o fato de ser possível identificar, em alguns atores, os trejeitos dos animais que serviram de pesquisa para a criação da partitura corporal do personagem. Dessa forma, vê-se uma divisão entre os atores que deixam claro o animal que os inspirou, e os atores que incorporaram o animal à sua movimentação, sem deixar explícito de qual se trata. A atriz que interpreta Regana é a que mais deixa a mostra esse problema, que também aparece – em menor grau – no personagem Edmundo.

         Essa explicitação cria um ruído que afeta negativamente a unidade do espetáculo. Caso o diretor decida rever esse aspecto, o espetáculo ganhará em força e brilho.

         Rei Lixo” é um exemplo de criatividade e apuro técnico e espetáculo bem feito. Desejamos que tenha uma longa carreira nos palcos do Rio Grande do Sul e do Brasil

           

 

STELLA BENTO

NOVEMBRO 2025

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