terça-feira, 25 de junho de 2024

1180 - Esconderijos do Tempo - Tomo 94

Quem é o diretor?


                       Quando você saía de casa para ir ao teatro anteriormente ao século XIX, você ia admirar a beleza de um texto, a efervescente mente daquele homem, infelizmente muito poucas mulheres, e suas centenas de possibilidades dramatúrgicas.  Hoje você não mais preocupa-se com o texto, pois é a perspectiva do diretor que reina absoluta. O diretor diz algo que o texto não diz, ele quer expor a obra não apenas à apreciação, mas também à reflexão do expectador. Acredito que tenha sido Jean Jacques Roubine quem disse que o encenador é o gerador de unidade. Ele nos revela a dinâmica daquela determinada realização cênica. Através da direção, conseguimos ver os laços que unem figurinos, cenários, interpretações, iluminação e etc....

                         O público de teatro, a meu ver, já aprendeu a receber o espetáculo como uma totalidade, o que não acontecia nos séculos XVII e XVIII por exemplo. Uma pessoa que tem o costume de ir à casa de espetáculos olha para o palco com olhos rápidos e observadores, ela percebe quando um figurino destoa do cenário, ou quando um ator declama um pouco demais, em comparação aos seus colegas de cena. 

                           Geração após geração do teatro moderno foi ajudando a formatar essa soberania que se apoia na figura do diretor e que emprega a um trabalho teatral o titulo de obra, obra artística que um "obreiro" criou. É portanto, necessário que os atores, as equipes, os técnicos, compreendam o que aquele diretor quer dizer. Com aquela música especifica, com aquele gesto, com aquele caminhar, com aquela interjeição, com determinada réplica. Cada ator ou atriz, ou pessoa de teatro, e aí emprego as dezenas da possibilidades profissionais que consigo pensar quando observo sob a égide de trabalho, entende, pensa, age diferente. Mas é apenas um ser que assina a historia. Ele sabe por que a canção na cena da valsa é o tema de Lara, do filme Doutor Jivago. Por isso ele jamais erraria a musica correta de uma cena. Ele sabe por que um menino entra em cena chutando o chão, ele sabe o que quer passar com o visual da jovem atriz interprete de Glorinha. O público quer portanto absorvê-lo, devorar cada signo, cada símbolo dessa criatura poderosa. Antes disso no entanto, os membros da equipe, do projeto, do espetáculo, precisam compreender o que vai entrar no palco. 

                              Que historia estamos contando? Por que há um  paredão de tule no fundo do palco? Por que aquela atriz está vestida com roupa de baile de gala? Por que a musica ambiente é a de Gustav MAhler? Por que dele e não de Beethoven? O meu receio é que alguém diga: - Ora, por que o CLéber gosta desse... - Essa resposta seria frustrante demais. 

                             A resposta enfim, é essa, saber, compreender, perguntar. É isso que um membro dessa equipe deve sempre pensar. Devo perguntar tudo e possivelmente ter um caderninho para anotar tudo. Do contrario jamais irá compreender por que um ator sobe ou não na complexa porém óbvia hierarquia desse grupo.

                              Constantemente as pessoas dizem que um diretor quer saber mais, se acha superior, é absolutista ou despótico. Ora imaginem você te rum filho, que você se programou para ter, e todos ao seu redor ficarem dizendo como cria-lo, como vesti-lo para a escola, o que lhe ensinar ou não... O espetáculo é do diretor. Por isso há de se tomar muito cuidado quando um ator se apropria de forma equivocada de um espetáculo e acha que sabe o que o diretor quer dizer com aquela obra e ainda fica dizendo o que acha que os outros da equipe devem fazer, ou como devem agir. 

                                O diretor sabe de tudo, sobre o todo, não por que ele é melhor do que alguém, mas por que sua peça é como seu tcc. O Orientador não saberá, o colega não saberá, o cara que foi contratado para digitar não saberá. A única pessoa que compreenderá o TCC é a pessoa que o criou. A função dos atores não é a de ser diretores. A função dos técnicos não é a de ser diretores. A função dos contrarregras não é a de ser diretores. A função de todos é executar bem suas funções e tentar ENTENDER uma obra e não prejudicá-la. 

                                A apresentação no espaço Adão Ortiz, foi linda, criteriosa, elegantérrima. Teve logicamente seus pequenos resvalões, afinal uma equipe é viva e mutável. 

                                 Respeitemos a figura do diretor, ele batalhou muito para chegar onde chegou...



Esconderijos do Tempo

Direção Cléber Lorenzoni 

Roteiro e Dramaturgia - Cléber Lorenzoni e Dulce Jorge

Elenco

Cléber Lorenzoni - Dulce Jorge - Clara Devi (***) - Fabio Novello - Laura Hoover(**) - Renato Casagrande - Antonia Serquevitio (**) - 

Participação Especial - Felipe Brandão

Iluminação - Fabio Novello e Romeu Waier (**)

Sonoplastia - Gabriel Ben (*) e Ellen Faccin (**)

Contrarregragem - Ana Clara Kraemer (***) e Douglas Maldaner (**)



                              

                             

Ao público


 

A cena inicial de Esconderijos do Tempo, nasce um poeta!


 

O carinho do público do Alegrete


 

quarta-feira, 19 de junho de 2024

Matéria sobre teatro nas escolas


 

O Juramento - Cerimônia de ascensão


" Juro em meu nome e em nome do meu grupo e do meu público, dedicar minha vida, seja ela breve ou longa, aos deuses do teatro, a interpretação e ao fazer artistico. Levar a cultura do teatro aos públicos mais distantes e lutar pelo desenvolvimento de uma plateia crítica. Defendendo sempre a arte cênica em busca de um mundo melhor."

segunda-feira, 10 de junho de 2024


 

1175- Esconderijos do Tempo (tomo 93).

 Fechei os olhos e acordei em 2009...


Que diáfana alegria, teatro na Casa de Cultura em uma tardinha de domingo, começar a semana inspirada, reflexiva, motivada pela arte. Que bom seria se em todos os domingos fosse assim. Como ir ao cinema. Porém, com nossos artistas, com nossos conhecidos e em um texto dito ali, presencialmente, poucos metros de distância. E que texto!

Mais tarde em casa, tomando um cálice de chardonnay, avaliei o valor daquilo que foi visto. Impagável! Uma pintura, uma obra prima do Máschara. Coerência, dramaturgia física e literária, um presente. Uma trilha sonora elegantíssima, de Massenet à Bach.  Claro que é importante compreender que não é uma peça sobre Mario Quintana, e sim uma peça sobre o que Cléber Lorenzoni quis dizer através da obra de Quintana. Isso nos revela um temperamento Melancólico/Fleumático do diretor.

Lorenzoni e Dulce Jorge escreveram Esconderijos do tempo em 2006, um ano difícil para o Máschara, Centenário de Quintana e com produção de Roger Castro. A Análise Ativa de Stanislavski é visível aos olhos, e surpreende pela coerência, ritmo e limpeza. "Não há barrigas", "não há equívocos". Há é claro por vários motivos, uma simplicidade exagerada na iluminação do espetáculo, não temos luz para teatro em Cruz Alta. Há uma certa tensão que paira sobre as zonas de trabalho. A plateia não percebe, mas esta crítica de teatro está no negócio há muito tempo, então já aprendi a perceber os sinais. Uma cortina que s emeche, um sinal que sai de traz de uma coxia, um sussurro...

Elenco indelével, embora Hoover possa e deva falar mais alto. Por isso é importante praticar teatro sempre, fazer aula, estudar! Em contra ponto, partitura magistral. Um presente corporal!  Talvez se fale de seus exageros, mas em um auditório grande e plano como a Casa de Cultura, as expressões exageradas de Lili foram muito funcionais.

Devi esteve surpreendente. Firme, elegante, inteira. Uma delicadeza que vi em poucas Glorinhas, talvez seja importante trabalhar com calma agora a comicidade que está na entrelinha do texto.

Dulce Jorge deu um show de detalhes em seu monólogo. (Não era um monólogo, mas chamarei assim, pois esteve plena falando da morte). Serquevitio estreou bem no espetáculo, mas precisa estar mais segura em cena. Novello roubou a cena, merece aplausos pela forma como pronunciou o soneto.  Essa é a característica de atores do quilate dos anciãos do Máschara, que são anciãos por serem preparados, por estarem preparados. Cléber Lorenzoni criou Quintana com tantos detalhes arrebatadores, o personagem começa parecendo uma criança, depois um adolescente, um adulto, um adulto de meia idade, um idoso, um ancião, e finalmente um ancião debilitado e tudo de forma muito delicada. 

A participação de Felipe Brandão foi um detalhe a parte, e culminou no agradecimento, que sim, jovens artistas, é parte de um espetáculo. Lembremos, se o espetáculo for ruim, um bom agradecimento pelo menos pode fazer valer o ingresso. Casagrande entra grandioso, potente, talvez pudesse estar mais em cena... 

A iluminação assinada por Fabio Novello e Romeu Waier, foi muito bem executada, sem atrasos, ou aberturas bruscas. A trilha de Lorenzoni, executada por Ben Borges cumpriu e emocionou. 

Preciso claro falar da plástica, detalhes que são a assinatura do grupo, com o olhar severo de Lorenzoni. Veja bem, os tons azuis em Glorinha, cuja saia vai ficando escura no passar do tempo. Os tons magentas em Gouvarinho. O visual de Quintana, até com as meias vermelhas que o poeta apreciava. Greta Garbo em saia Salmão para combinar com Malaquias. A asa de poemas, idealizada pelo artista Fabio Novello, ficou lindíssima. O aquário que lembra uma cascata de folhas, o figurino da menina Lili com meias infantis... Tudo convergindo, e fechando com chave de ouro na miniatura de Quintana, interpretada por Brandão. 

Encerramos com vontade de ter Cena às 7 todos os meses, de irmos ao teatro, de levarmos nossos filhos. 


   O pior: A luta de Lorenzoni tirando suas alianças em cena

   O Melhor: O  retorno de um espetáculo que é sempre uma aula de teatro. 


Esconderijos do Tempo 85º Cena às 7

Clara Devi (***)

Antonia Serquevitio (**)

Laura Hovoer (**)

Romeu Waier (***)

Cleberson Ben Borges (***)

Ellen Faccin (**)

Ana Clara Kraemer (**)

Nicolas Miranda (**)

Felipe Brandão (***)

Carol Guma (**)

Obrigado aos anciãos Dulce Jorge, Cléber Lorenzoni, Renato Casagrande, Fabio Novello e Ricardo Fenner, por nos darem tanto, por nos ensinarem tanto.



Arte é Vida


A Rainha

Mais uma ascensão, dia de festa para o Máschara


 

Plateia à espera