1037- Quem matou Aparecida (tomo 001)

                 Foi de uma enorme sagacidade, perspicácia  mesmo, quando o grupo teatral máschara desenvolveu a hierárquica projeção dos status relacionados aos artistas do grupo, pelo fato supostamente lógico, mas nem tanto, de que o trabalho dos membros de toda a equipe das artes cênicas ligadas ao grupo Máscara, são iguais embora com  a possibilidade dinâmica de aperfeiçoar-se, desenvolver-se e aprimorar-se. E essa deve ser sempre a busca de quem é do palco: melhorar, pesquisar, crescer...

                  Na noite da última quarta-feira um texto singelamente "esculpido",  esse é o termo que ele merece,  devido às tantas possibilidades estéticas, sentimentais e reflexivas. FerreiraGullar escreveu "Quem matou Aparecida"? a historia de uma favelada que ateou fogo as próprias vestes, em 1962, com a roupagem do CORDEL. O Concrestimo e o diálogo com a cultura popular, empregaram à Gullar um espaço único no estrelado céu de escritores brasileiros. 

                   Eu que não me recordava mais desse texto, me surpreendi com interpretações razoáveis dos atores status 2 e 3 Fábio novelo e Alessandra Souza. A premissa muito simples: textos de uma mulher sofrida de nome Aparecida e seu contexto enquanto criatura brasileira pobre do sexo feminino já nesta descrição todos os preconceitos e pontos de vista guardados dentro de nós em uma sociedade patriarcal e machista dão o tom do que se pode ver no palco na interpretação de Souza. Uma atriz de mordida... Uma atriz forte, visceral e que as vezes esbarra no piegas. 

                     O desenho de cenas é original, criativo. O ritmo intenso, bonito. Mas certamente era uma estreia, pois o aprumo, o cuidado,o alinhavo e a assinatura típicas do grupo teatral máscara não se fizeram presentes; era uma performance, foi nos dito mas havia nela princípios de começo meio e fim, básicos e necessários em um bom espetáculo. Mas parecia haver ao mesmo tempo uma despreocupação com o "espetacular". A intérprete é forte mas às vezes não canaliza a sua força e a transforma em peso, peso esse que se encontra em contraste com as tábuas leves do sagrado palco do auditório do Instituto Annes Dias. As energias retumbaram abafando o bonito texto de Ferreira Gullar. Ora precisamos e queremos atores e atrizes leves que quase não encostem os pés no chão. Mas a carga emotiva o desenho as linhas do corpo são típicas dos bons atores do Máscara, herança certamente de um trabalho que começa ainda na década de 90 com Dulce Jorge e vai se transformando. Fábio novelo faz as vezes de contra regra, diretor ator e ator contador: há uma base neutra que se transforma em várias figuras. Porém esta base neutra precisa de mais detalhe, uma construção maior. Um mérito muito bonito é a sutileza com que ele passeia pelo palco quase sem ser visto, enquanto a personagem de Aparecida assume a postura de atriz principal. 

                        Aparecida é um bom começo de algo que pode se tornar muito grandioso. 

                        Basta ter  sensibilidade..      


              Melhor: A coragem e disponibilidade dos dois atores sobre o palco

              Pior: A desorganização da equipe envolvida.



Fabio Novello

Alessandra Souza              

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