O encerramento de uma tournée como a Paixão de Cristo, abre novos olhares sobre o teatro, possibilita recomeços e incentiva novos artistas. Vamos então falar sobre a arte do ator, que é o teatro e como ela se divide em arte do dramaturgo, quando falamos do texto e arte do diretor, quando falamos de espetáculo. Até meados do século XX, somente André Antoine, aquele da quarta parede, havia realmente ocupado um espaço próximo ao que conhecemos como diretor. O encenador afastava-se da figura do ensaiador, já que aquele era apenas o agente criativo que, juntamente com o cenógrafo ou o músico, “planejava, organizava e executava o espetáculo teatral orientando os atores de acordo com uma tipologia de papéis. O encenador é que passou a pensar o espetáculo como algo que falaria ao público não só através do texto. O advento da cena naturalista, no final do século XIX, impulsionada pelo surgimento da fotografia, da luz elétrica, do desenvolvimento das ciências e o otimismo ideológico – para citar alguns fatores – favorece uma teoria mimética da representação. Esta teoria se funda na dialética da representação: há, de um lado, a aspiração à reprodução idêntica do real, e, de outro, as convenções sem as quais a reprodução não existiria (que devem ser transformadas, não ignoradas).
O diretor/encenador surge realmente com Artaud no século XX, e é uma figura importante no teatro moderno por interferir no modo como o espetáculo é concebido e na atuação dos demais integrantes do processo de criação. Ele pode assinar a concepção estética de um espetáculo e conduzir o processo ou pode intervir em questões pontuais como a direção dos atores ou, até mesmo, conversar com diferentes setores criativos, como a iluminadores, e cenógrafos. Contudo, um consenso encontrado e que determinará o uso da nomenclatura diretor/encenador ou somente diretor ou encenador, é que o encenador possui a função de conceber o espetáculo pensando na sua totalidade, unindo todos os participantes e suas criações, que podem ou não estarem subordinadas a ele, a fim de construir um todo que seja uma obra única. O encenador pode se deixar influenciar pelas criações dos demais integrantes do processo, quando possuírem uma autonomia para isso, modificando a sua concepção ou pode restringir os demais a alcançarem o seu ideal concebido.
Durante muito tempo viu-se o dramaturgo, como o maior merecedor da glória, O ‘textocentrismo’ fazia com que o dramaturgo fosse o principal componente do processo de criação, cabendo ao diretor e aos atores interpretarem da melhor maneira possível os elementos presentes na peça, transmitindo a intenção do dramaturgo.
Em a Paixão de Cristo, Cléber Lorenzoni é dramaturgo, diretor, ator, e capacitadamente envovle-se em todos os setores, e ainda prepara os atores que em sua quase totalidade são seus alunos. Somando-se a isso, o olhar de Lorenzoni sobre cada trecho do trabalho, eu diria que ele passeia por formas já buscadas por Meyerhold e Peter Brook. Ambos para suas experiências, precisaram de atores-criadores; ou como diria a atriz Angelica Ertel atores-pensante-atores. E é por isso que o "mestre" Lorenzoni desafia, testa, força, incentiva... Para que os atuais atores da Companhia emanem sua arte. Ora, o ensaiador e o encenador dos séculos anteriores, não importava-se nem um pouco com a arte dos atores. Queria apenas que cada um pronuncia-se com clareza o texto, e preenche-se visualmente os tipos necessários para os papéis, exemplo: Julieta jovenzinha, branca, delicada etc... Kaifaz, velho, levemente gordo, branco, etc... Lady Macbeth, branca, levemente jovem, sedutora, linda, etc...
O diretor contemporâneo busca talento, atração, força, mordida, garra, frieza (em alguns aspectos), respeito e amor pelo teatro, compreensão de hierarquia. Além disso, algo a dizer, é imprescindível que atores tenham algo a dizer. O problema é que alguns confundem o espaço de fala, acreditando que é somente através do texto que se fala. Não esqueçamos que muito é dito em um olhar, em uma composição corporal, em uma coreografia, em uma maquiagem...
Clara Devi vem também seguindo os paços de Cléber Lorenzoni e a metodologia do "palacinho", as vezes prejudica seu trabalho de atriz, colocando a parte técnica a frente. É preciso atuar e ambicionar aquilo que se busca, sem arriscar a vida no palco. A palheta de cores sobre o palco tem muito a ver com sua disponibilidade de dias e dias elencando tecidos e peças que estavam guardadas ou esquecidas. Na apresentação de ontem via-se seu amor e dedicação, em cada cena, quando tirava adereços, apoiava os colegas e brilhava (***).
Laura Heger sobe de status, mostrou que tem muito a dar ao teatro, um olhar doce para com todos, uma gigante em cena. As responsabilidades que assumiu poderiam colcoar em risco suas cenas, no entanto fluiu ainda mais (***).
Douglas Maldaner fez certamente um de seus maiores trabalhos em Paixões de Cristo. Cléber Lorenzoni exigiu-lhe muito e seu sacrifício teve sucesso, ao lado de Romeu, Eliani e Laura, fizeram a corte de Herodes mais poderosa das quatro edições(***). Ellen Faccin é o tipo de contrarregra que um grupo precisa. E embora alguém tenha me dito que ela está prestes a dar um tempo, eu aconselho-a a lutar. O Máschara passa por grandes transformações, é onde eu estaria se pudesse viver de teatro(***). A maneira como a profissional interage, fixando o olhar no diretor. De onde eu estava sentada nem via ela se mexer. Uma profissional.
Arte é Vida
A Rainha
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