964/965-Tem Chorume no Quintal - tomos 10 e 11

 UMA AULA DE TEATRO


                      Uma vez, o diretor, Cléber Lorenzoni, me disse que o verdadeirot eatro acontece em casa, ao redor do fogo, na cozinha, enquanto os velhos se aquecem e contam historias e os mais jovens curiosos observam o mundo grandioso que os aguarda. Observar, ouvir, aprender sempre. Passar a diante as historias de nossos ancestrais, ir construindo o mundo através de narrativas. O teatro é feito de gotas, que são os espetáculos e que são lançados. Quando uma Cia., cria um espetáculo, imagina ele chegando em algum lugar de obra prima, que irá fazer moda, mudar ideologias, marcar época. No entanto o mais mágico do teatro, é ver sua simplicidade. Sua pequena função lúdica que se cumpre em si mesma. 

                          Nas duas apresentações de Tem chorume no Quintal na cidade de Ijuí, o Máschara deu aula e recebeu aula. Aula de simplicidade, com um espetáculo que não tenta complicar as coisas, ao contrário, sem muitas enrolações, ele fala abertamente do que se propõe a falar. Isso é um mérito, quando levamos em conta os públicos aos quais a trupe apresenta suas obras. Ora, sendo um grupo de interior, boa parte do público é formado na sua maioria, por pessoas que não tem o hábito lapidado de ir ao teatro e lidar com convenções. Não é como apresentar um espetáculo ao público de Porto Alegre, ou de Novo Hamburgo, ou Caxias... Há trabalhos mais complexos, como por exemplo Lili Inventa o Mundo, que exige um grau de iniciação muito mais apurado. Aqui não! Aqui fala-se dos resíduos fecais do pet que são deixados na rua, fala de sacos plásticos que levarão mais de trezentos anos para se decompor. Linguagem clara. 

                             Cléber Lorenzoni interpretando novamente dois personagens, como na semana anterior em O Grande Circo, consegue nos surpreender e rapidamente improvisar, controlar o público, jogar com ele. Um mérito de quem dirige há já muito tempo. Aliás, os quatro anciãos do Máschara envolvidos, atuaram com maestra tranquilidade. Alessandra Souza muito completa em uma de suas melhores construções. Fábio Novello pegando rapidamente a função de iluminador e sonoplasta, uma função sempre desvalorizada, que nos apresenta frases como:-Se não tem quem faça, coloca-se geral branca e pronto! - ou - Qualquer um aperta os botões... - Triste profissão! Renato Casagrande tem praticamente o espetáculo em sua mão, aliás agora, ele está dividido em exatas quatro mãos: As dos dois atores Status I. Renato tenta elevar o lado cômico, Cléber tenta trazer o polo da organização da trama. Ambos alcançam seus objetivos. 

                            Mas o público quer se encontrar como no principio de tudo, em torno da fogueira, onde os idosos se riem das piadas mais maliciosas e as crianças querem provar sua sagacidade. Seja ela com comentários frustrantes ou com espargates. O mérito de um elenco é como ele se precaverá e se solucionará e foi excitante ver os olhinhos rápidos do elenco de Tem Chorume, decidindo rapidamente quais falas extirpar do texto. O espetáculo da primeira inserção esteve nas mãos dos atores, mas na segunda foi o público quem comandou, e eis aí a sabedoria de alguns atores. É preciso fazer o público achar que está mandando... 

                             Os cortes rápidos dos textos, são escolhas dignas de grandes atores maduros, mas podem afetar e muito, atores iniciantes ou despreparados, que estão presos a convenções ou as ditas " deixas".  

                              O Teatro não é o texto! Alguém até me disse uma vez, que o teatro é o que acontece entre uma fala e outra... Nas reações... Ações... 

                              O elenco jovem, Clara Devi e Stalin Ciotti, se sobressaíram bastante nessas apresentações e eu diria que o Máschara está alcançando aquele ponto em que todo o elenco tem unidade interpretativa. Embora Clara Deva precise se dedicar mais à técnica vocal. O volume baixo, ou a dicção afetada pode se tornar um hábito, e hábitos dificilmente são vencidos. No elenco de acesso, Douglas Maldaner embarca nessa compostagem e agrada e muito. As crianças costumam gostar de quem tem bom coração. Quem rouba cenas, ou é rude no palco por baixo da mascara, precisa sempre lutar mais para ter a aceitação da plateia. Outro mérito do ator, é que ele se mantém no universo de Onófre, sem copiar a personagem do interprete anterior. 

                               Douglas Maldaner e Cléber Lorenzoni jogam muito bem, embora ao final da segunda apresentação o intérprete de Óffice, tenha demorado a compreender o comando de sair de cena pelo foyer do teatro, talvez por que Douglas não compreenda a mente tão lúdica do diretor.  As gags  de Óffice são muito boas, e o ator pode aprofundar-se muito na personagem. Nunca esquecendo: Personagens não tem donos, nos foram emprestados quais filhos, para que os tornemos grandes e preparados. 

                                   Tem Chorume no Quintal possui três grandes cenas e três entremessos curtos, ou seja. Introdução, entremesso, grande cena, entremesso musical, segunda grande cena, segundo entremesso, solução. É preciso ater-se principalmente a segunda grande cena. Ali o ritmo pode cair... 

                                     A contra-regragem do espetáculo teve alguns deslizes, mas percebi que envolveram uma nova jovem por traz das coxias. É bonito como o Máschara oportuniza espaço de aprendizagem e crescimento. Ser contra-regra é maravilhoso, auxiliar um elenco, só é preciso sempre lembrar, que teatro é trabalho duro. Que quando se viaja, todos representam uma bandeira, uma marca, que precisa ser profissional! Acompanho esse grupo desde 1998, e sempre me admirei com seu crescimento, e isso se deve ao pulso firme do diretor e espero que seus anciãos o ajudem sempre a manter firme a historia de sucesso do Máschara. E lembrem-se, cuidado para não ter CHORUME NO QUINTAL!

                  O Melhor : Os anciãos do Máschara e sua tranquilidade cênica.

                  O pior: o despreparo de alguns jovens atores em lidar com a plateia viva.


Ijuí-16 de outubro. Tem Chorume no Quintal (E.38-2019)

Argumento e direção - Cléber Lorenzoni

Elenco: Renato Casagrande

Clara Devi (**)(*)

Cléber Lorenzoni

Alessandra Souza

Stalin Ciotti (***)(**)

Douglas MAldaner(***)(**)


Contra-regragem-Antonia Serquevittio (***)(**)

Iluminação e Sonoplastia- Fábio Novello

Guarda-roupa-Clara Devi

Cenários e Maquiagens- O Grupo



Arte é Vida -  A Rainha






                                  

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