O Menino do Pastoreio - (tomo II)

 Onde nasce um ator?


                                Ora, alguém poderia dizer que nasce no dia do parto, e que dali parte dentro de si o talento e a pre-disponibilidade para um dia se tornar um "grande"do palco. Mas a pergunta que faço se refere a forma mais técnica. O ator é um eterno estudante, da obra, do personagem, do dramaturgo, das técnicas, de suas potencias sobre o palco. Quando porém o ator nasce? Quando se estabelece nele a certeza de que pode se dizer um ator? 

                                   Hoje, enquanto assistia A Lenda do Menino do Pastoreio, refleti muitas situações, observei respeitosamente cada um dos atores, cada gesto, cada inflexão vocal. Sobreviventes! Esse é o nome que deve ser dado  àqueles que apesar dessa pandemia conseguem ainda lutar pela arte. Aqueles que em meio a depressões, a desmotivações, a abandono da profissão, foram capazes de se manter firmes. Meus parabéns ao Grupo Teatral Máschara que luta, que arde, que pulsa em meio há tantas dificuldades. Que cria e produz, mesmo em meio a uma sociedade que parece fazer força para viver aquém dos artistas... 

                                    O "professor ou tio Cléber", que admiro pela coragem e entrega, tem trabalhado nos últimos anos com temáticas mais próximas de nossa realidade, assuntos de debate contemporâneo, embora as dores e tragédias do homem atual sejam muito semelhantes as dos clássicos da dramaturgia. 

                                       O Menino do Pastoreio é uma trama muito conhecida, muitos foram os escritores que usaram do argumento ora para criticar, ora para enaltecer uma raça. Nicolas Miranda amadureceu muito, e como é prazeroso acompanhar a caminhada de um jovem intérprete. Primeiro como uma das bruxinhas em Encantamentos (2017) depois como o maroto criado de O Hipocondríaco  (2019) e agora como o Nerêncio. O prólogo do espetáculo precisa certamente de mais ensaios, mais precisão, mas ele vale por todo o espetáculo. Fiquei em dúvida se é Nerêncio quem grita exigindo justiça na primeira cena. Nesse caso me parece que o espetáculo tem três Nerêncios. O Corifeu, o menino rico e o escravozinho. Foi então que me lembrei de uma regra crucial para quem se alimenta da obra de Lorenzoni, o prólogo é a resposta de tudo. É ali que se mata a charada. Nerêncio diz à "madrinha de quem não a tem" :-Não sei se compreendi o que a senhora disse...   -Pois até então ele ainda é o menino escravo, sem estudo, sem compreensão das complexas da humanidade. No entanto depois de livre ele é levado pela Santa madrinha há um novo local, um limbo, onde se torna o então compreendedor Nerêncio que a catarse do espetáculo espera dele. Não basta ser vitima, é preciso saber onde estão os erros e pedir mudança. 

                             Me parece que agora Nicolas Miranda  é um dos prometeus do Máschara, merecido, um jovem que tem muito a acrescentar para a arte e que deve se perguntar sempre... Quando eu nasci?  

                                  No elenco de apoio grandes valores como Renato Casagrande em co-ator, seu forte na Companhia. O que demonstra a confiança que a direção lhe emprega. Há atores que nasceram para nos encantar em grandes papeis,  atores que nasceram para se esparramar em divertidos coadjuvantes e há atores que se saem bem em figurantes. 'E preciso sempre ter a medida de nosso talento. 

                                           Cléber no vilão e Alessandra como tia Tereza, repetem a formula de Chorume. Como se assistíssemos uma semana de  espetáculos de Comedia dell art, em um dia Chorume, em outro, o Menino do pastoreio. Isso se chama fórmula: mesmas forças, mesmos talentos, mesmas capacidades, usadas para contar duas boas historias. Ironicamente em ambos os trabalhos, Lorenzoni interpretando dois papéis. 

                                            Clara Devi, a "mocinha" da companhia nos dá o primeiro trabalho visivelmente maduro de sua carreira. Cria-se aqui um novo piso, uma nova base, de onde surgirão grandes papeis. Ainda no elenco Laura Heger, outra das grandes revelações do Máschara, mas que nesse espetáculo parece pouco utilizada.

                                    O Máschara faz "nascer" grandes atores,  grandes espetáculos, obrigado por tanta reflexão!   Ainda que em tempos mortos...




A Rainha      


Arte .................................................... vida  



                  O melhor - A dramaturgia de Cléber Lorenzoni e a fluência de Alessandra Souza como: A Madrinha de quem não a tem.

                          O pior: A visível falta de ensaios e o material muito ineficaz de som, que pôs em risco a fluência do espetáculo. A pedido, a quase perda de um item valioso do guarda-roupa,


       Clara Devi (**)

       Nicolas Miranda (***)

       Martha Medeiro (**)

       Kauane Silva (**)

       Laura Heger (**)




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