916- A Lagoa do cemitério - curta

  A arte efêmera do teatro, imortalizada através do vídeo


                        Quem decide o que é bom? Quem decide o que é arte? Quem decide qual o conteúdo a ser assistido ou valorizado? Qual a importância da crítica especializada? A arte nos chega em ondas, interrompidas em seus fluxos. As informações de obras lançadas aqui e acolá são pulverizadas em meio a tantas informações. Modismos. Há ainda que se perceber que muito do que faz sucesso, dura vinte e quatro horas, até que alguém diga que outra coisa é sucesso. 

                       Não há como decidir ou decretar um sucesso, ele vai se estabelecendo aos poucos, através do crivo de tantas "tribos", com seus olhares e vieses vanguardistas ou conservadores. 

                         Eu assisti há alguns meses, Lendas da Mui Leal Cidade, filmagem do espetáculo apresentado em 2018, por isso hoje esperava ver algo semelhante no produto patrocinado pela Lei Aldir Blanc. Tomei uma agradável surpresa, logo nos primeiros instantes da obra. 

                             Sem verba alguma, munidos de um aparelho de celular, esses jovens artistas contaram uma de minhas lendas preferidas, até por que por exemplo a lenda da Panelinha parece ser plágio de uma lenda de outra cidade e se não me engano em verdade, várias cidades do Brasil contam como testemunho de sua formação o poder de uma água mágica. Aliás, a maioria das cidades e civilizações floresceram ao lado de córregos e rios, a começar por Tigre e Eufrates.

                               A lagoa do cemitério acrescenta ao imaginário coletivo, a severa ideia de que esta terra fora amaldiçoada, e só se tem sucesso quando se parte daqui para outras "freguesias". Para esta senhora, parece mais a desculpa de quem busca sucesso fora de Cruz Alta. Enfim, lendas são causos que vão sendo enriquecidos com detalhes e apontamentos à cada geração. 

                                   Assistindo A lagoa do cemitério fiquei orgulhosa da ESMATE, um lugar para se apontar caminhos de arte para os jovens, de debruçar-se sobre bons assuntos e ainda, revelar talentos. 

                                 Que equipe maravilhosa. Stalin Ciotti é o primeiro nome que preciso elogiar, logo em seguida a grandeza de Martha Medeiro e o amadurecimento de Laura Hoover. A cena em que ela aparece para as lavadeiras é arrepiante. Gosto de silêncios, de pausas, de reflexões internas e isso se vê em duas grandes atrizes que tem muito a ensinar: Dulce Jorge e Alessandra Souza. 

                                  Senti falta de mais profundidade na construção do cura de Renato Casagrande, e do Euláio de Cléber Lorenzoni, claro que são dois grandes intérpretes e seu parâmetro é digno do seleto grupo dos grandes artistas do Máschara. 

                                      Gosto da forma como o roteiro interlaça as historias, reunindo as lendas de forma a quase enchergarmos a Cruz Alta dos tropeiros. Há certamente falhas, ruídos, ecos, escapes de luzes, erros até mesmo na linguagem retórica que tenta pontuar a época do Pouso da Cruz Alta, mas tudo parece muito pequeno se comparado com a importância em contar-se boas historias. A arte é algo engraçado, os artistas parecem seres de um universo paralelo. Como diz Fernandona, eles moram em catacumbas, em porões, abrigos anti-guerra. Os artistas são corajosos, criadores de universos, e parecem mesmo ver e conceber coisas que eu por exemplo jamais conseguiria.                                                                                   A cidade cenográfica é uma obra de arte a parte e ali quase se podia contar O tempo e o Vento... Eu mesma não imaginava que tivéssemos em Cruz Alta, algo assim. 

                                          O cuidado com os detalhes, tem a ver com Renato Casagrande e a aprendiz Clara Devi. A lista de agradecimentos no final, reflete a humildade e a consideração que um grupo com tantos anos reflete em seu trabalho. Dito isso tudo, o resto é aproveitar. O cão que corre na porta da igreja, a flor de corticeira que Lívia apanha no encontro furtivo com seu Euláio. O diálogo dos tropeiros que em meio a vida nômade começam a se apaixonar pelas jovens da terra. São muitos detalhes e muitas capacidades que se cruzam. O estancieiro de Ricardo Fenner é algo novo, e o ódio em seu olhar é muito poderoso para a trama. Muitos são os elogios e muito é o valor que Clébe Lorenzoni dá ao trabalho de atuação de seus alunos. Um arrojo.



                                Estão todos de parabéns e merecem todo o carinho e agradecimento de cada Cruzaltense por contaram com tanta dedicação essa historia. 

                                           Parabéns e Viva a arte.



                                                   A Rainha




                               

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