872 - Um conto de cinderela - (tomo único?)

Jogo, jogo,. jogo...

       Conseguir permissão para assistir teatro em um escolinha não é fácil, quando não se tem nenhum dos seus pequenos como membro aluno daquela instituição. Mas como deixar de assistir a primeira grande inserção de bonecos do Grupo Teatral Máschara? 
       Os fantoches, ou marionetes, ou ainda bonecos, estão presentes em ações da humanidade há pelo menos três mil anos, tudo por que o homem sempre procurou formas cênicas e lúdicas para comunicar-se com os seus. E os anos passaram, e embora muitas técnicas tenham surgido, as formas de manipulação continuam lúdicas, de certa forma muito rústicas e primitivas, que é exatamente o que mais encanta. Como um boneco sendo manuseado em nossa frente, por mãos humanas, e na maioria das vezes com a voz saindo da boca de seu manipulador frente aos nossos olhos, consegue nos envolver, emocionar, convencer? Ah! o teatro...
        O Máschara em toda a sua trajetória não havia ainda ousado construir um espetáculo de manipulação, apenas incertado detalhes que poderiam apontar para uma busca nessa área, primeiro em O Castelo Encantado (2005) depois em Os Saltimbancos (2012). Mas agora Cléber Lorenzoni teve uma daquelas inspirações em que ele lança uma ideia e toda a sua incrédula equipe se questiona: -Oh Deus, ficou louco, isso não dará certo...
               Mas dá, dá sempre muito certo!!!
               Diretores costumam ter essa sensibilidade, esse tino para a ousadia cênica. Claro que o mundo a seu redor não consegue ver o que eles vêem, por isso eles são os diretores, e não o mundo a sua volta. À Renato Casagrande coube a honra de transformar tecidos, linhas e lãs em vidas. E quatro pequenas vidas nasceram. Frederic I, Gastão, Drizella e Anastácia. cada um deles com uma personalidade própria que nasce da união entre criatividade, inspiração e sensibilidade para com a historia e aspecto do boneco. 
                    Foi um ensaio, dividido em duas partes pelo que me consta, claro que a obra passeia em cima de um conhecimento coletivo e quase que universal de um dos contos de fadas mais antigos da humanidade. Charles Perrault, Irmãos Grimm foram alguns dos que mergulharam nesse conto. Mas suas raízes são encontradas até mesmo na china pré Cristo. Sendo assim, quando Lorenzoni e Casagrande (St. I) aceitaram o desafio teriam apenas que optar por quais olhares lançariam à obra. De qualquer forma é importante pensar que não era um espetáculo teatral, era na verdade uma performance, uma contação de historia com personagens. 
                     Para o elenco, os diretores optaram por Alessandra Souza (St.II) e Laura Hoover (St.IV), boas escolhas se pensarmos na chance para essas duas atrizes abrirem seu olhar sobre o teatro. Crescerem como interpretes. O teatro nunca pode ser visto como um fardo. Ele deve ser e é, motivo de orgulho, ter a chance dos Deuses de subir no púlpito sagrado, receber carinhosamente um papel, um personagem, como se fosse um presente. Ser escolhido dentre tantos para dar voz àquilo que um dramaturgo, ou diretor ou autor escreveu, é ser especial em vários sentidos. 
                     A manipulação dos bonecos ficou nas mãos de Renato Casagrande e Cléber Lorenzoni, para que as atrizes observassem e aprendessem, o que claro não aconteceu, já que os ensaios foram restritos à um encontro. Mas manipulação é algo que exige sensibilidade, tino e muita coragem. Pois como disse mais acima, bonecos são seres perpetrados pelos dogmas do teatro. Eles possuem vida própria. No momento em que Anastácia, manipulada por Casagrande deu o primeiro berro, estava decidido, a boneca seria uma gritona. E que linda, romântica e sonhadora. Sua mãe insistia em criticá-la, em restringi-la à uma menina educada e do lar. "meninas educadas não gritam, princesas erguem o dedo para falar". Claro que essa frase castradora só poderia vir da megera. Cléber Lorenzoni nos deu uma vilã engraçada e detestável, mas o mais importante, que criou comunicação com o público. Não é a toa que ele fez animação em aniversários infantis durante anos. Renato Casagrande também tem um corredor de comunicação muito eficaz com o público infantil, herança de suas atuações como palhaço. O jogo cênico é muito funcional, as tiradas rápidas, as soluções. 
                   Alessandra Souza é uma atriz bastante técnica e isso não é um elogio, há de se buscar mais jogo, prática, sensibilidade. Em A noviça Rebelde por exemplo, Alessandra se saiu muito bem, digna de um " céu", no entanto aqui o teatro é mais de improviso, de sagacidade, de agilidade. Falta quebrar a casca, sentir o que o espetáculo precisa naquele momento. Souza é ótima atriz, mas precisa de humildade para aprender mais, aprender sempre. "Nunca tiramos férias do estudo" - (MAria, A noviça rebelde). Mas é preciso humildade para perguntar o que estudar...
                        Laura Hoover é um doce, jovem. Dois ou três anos de teatro. O que busca? O que estuda? Onde quer chegar? O louco prazer inicial do teatro, o dito talento, esfriam. Aí é hora da técnica. De onde vem a técnica? Onde você busca a técnica? Tenho certeza que a atriz quer sempre bons papéis, mas o que temos para dar em troca de grandes papéis.
                       A trilha foi muito fraca e só devemos aceitá-la por que trata-se de uma performance, feita em um ensaio. Era natural buscar canções e ações que já estavam na manga, não se cria arte sobre o palco de uma hora para outra. Os ensaios existem exatamente para ir preparando um clima de conhecimento e inspiração que vai dando aos atores e diretores saídas, signos e etc...Com um ensaio era natural que Um conto de cinderela fosse meio frio, por isso a direção optou por símbolos e códigos já existentes. Falta instrumento. Talvez alguém com um violão...
                          Estou sempre atenta, para exigir como platéia, o melhor dos atores sobre o palco. Nós, da comunidade teatral não podemos, não devemos, nos deixar levar por modismos, comercio, preguiça, mediocridade. O teatro tem cinco mil anos. O teatro é vida. O teatro é puro e verdadeiro. Deve ser sempre respeitado. 


                           Arte é Vida



Cléber Lorenzoni (***)
Renato Casagrande (***)
Alessandra Souza (**)
Laura Hoover (**)


                                           A Rainha

                        
               

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