De um diretor encantado com seu elenco...

                  Depois de mais de quinze anos sem debruçar-se sobre um trabalho educativo, (o outro foi Feriadão - 2002), agora retomo essa empreitada, com um texto feito por mim, um texto simples, todo escrito sob interferências Stanislavskianas. A análise ativa esteve inteiramente presente nessa  construção, as personagens têm e não poderia ser diferente, os arquétipos das personagens da commedia dell arte. E por que tudo isso? Por que sou fruto do teatro. Por que tudo o que escrevo ou construo sobre o palco, é reflexo de anos de estudo e meu teatro emana o teatro que apreendi dentro de mim, que antropofagicamente digeri. 
                    Vejo muitos jovens iniciando a vida teatral já querendo colocar no papel suas historias, seus pontos de vista sobre o mundo, todos cheios de ideias. Algumas vezes esse ato gera pequenas obras ímpares, obras incríveis. Mas eu, inseguro como dramaturgo, demorei anos, comecei mesmo adaptando. Meu primeiro texto realmente meu foi Esconderijos do Tempo em 2005, nove anos depois que comecei a debruçar-me sobre o estudo do teatro, e somente agora, com vinte e três anos de Máschara eu mergulho em um texto escrito por mim e de caráter educativo.
                         O resultado me é satisfatório, um espetáculo pocket, não apenas no tempo, mas de processo curto, (ensaios), um número de atores razoável, cenário adaptado, nada de contra-regragem. Poucas muletas e sem muitos circunlóquios. 
                          Não é medíocre, longe disso. É talvez, um espetáculo onde as técnicas ou a cartilha acadêmica estejam um pouco mais relaxadas. As técnicas são importantíssimas, as regras, a exatidão da ciência humana que é o teatro me representa e me orgulho de sempre carregá-las quais livros de cabeceira fossem. No entanto o teatro precisa ser versátil, mutável, questionador dentro de si mesmo, e as vezes a não técnica é técnica... 
                           Mas não estou aqui defendendo a fraqueza ou a simplicidade de um espetáculo, ao contrário, estou fazendo um passeio aprofundado nas entrelinhas de uma construção da qual muito me orgulho.  
                              Tem chorume no quintal é um trabalho de objetivo comercial, e com foco na necessidade em falar-se sobre o meio ambiente. Há uma guerra velada entre homem versus homem, uma guerra pela sobrevivência, na qual estamos perdendo. Uma guerra medonha e absurda, já que exercemos nela o papel de inimigo, anti-herói de nós mesmos. Um texto teatral é a melhor forma de um artista de teatro lutar, empunhando suas armas.
                                Ainda sentado na escrivaninha eu visualizava elenco e suas capacidades. Conheço razoavelmente bem meus atores. Queria aproveitar-me da capacidade e graus distintos de dedicação. Renato Casagrande por exemplo, conquistou em seus anos de teatro, a capacidade admirável de carregar um elenco, não é um ator extremamente dramático, diria mesmo que seus maiores trunfos são a comicidade e a força de sua presença cênica. Queria para dono de uma chácara, um ator que conseguisse transformar-se em cena com corpo e voz. A exemplo de sua participação em Lendas da Mui Leal Cidade (2018), o ator convence e levanta com energia todas as cenas nas quais está presente, além é claro de ser muito simpático à assistência. 
                                      Para a protagonista tinha várias opções, mas queria alguém dedicada, um pouco neurótica, o que é até certo ponto uma qualidade ótima aos atores, e principalmente alguém que carregasse a docilidade de menina. Clara Devi caiu como uma luva. A jovem ainda tem muito o que buscar na carreira, anos de estudo, de prática, de choques positivos e negativos. Espero que Alice fique sempre em sua memória como um ótimo exercício teatral, uma chance maravilhosa para o começo brilhante de uma carreira. Os frutos na pré-estreia foram: a melhora perceptível na dicção e  o ajuste de seu  espaço-tempo. 
                                           Alessandra Souza, foi a atriz que escolhi para a personagem cômica. Dona Cremosina, uma figura que carrega consigo toda uma volátil energia do teatro universal. Alessandra dá forma e sentido à figura, mostrando mais facetas de sua carreira teatral. Ao lado de Renato Casagrande, ambos estão ali para oferecer equilíbrio, nunca deixando a protagonista sozinha em palco. Quando não está com eles, Alice divide o palco com Madame Rafaela, (minha primeira vilã assumida), um presente que me dei, e do qual me orgulho muito. Ainda devo ater-me com mais dedicação a ela, mas já visualizo bons frutos. 
                                            Para meu partner de cena, Office, escolhi Vagner Nardes, não é um ator do Grupo Máschara, pro outro lado é um jovem dedicado à arte e que tem evoluído muitíssimo desde que mergulhou no mundo da arte. Juntos criamos muito nos ensaios, e o papel que parecia bem pequeno cresceu muito, e na própria pré-estreia ganhou a cena com sua sagacidade e disposição para ser escada na cena. 
                                          Toda boa historia, seja educativa ou não, precisa de uma dose de descoberta romântica, e para isso Stalin Ciotti foi elencado, Ciotti é o tipo de ator que qualquer Cia. gostaria de ter, ele recebe uma pequena instrução, algumas informações sobre o universo de sua personagem e ali constrói com detalhes; Júnior foi o campeão dos risos na pré-estréia e fiquei muito orgulhoso de como o ator soube compor sobre meu texto. 
                                        Para encerrar o elenco, Evaldo Gullart que nos últimos meses tem se dedicado como em outrora. Está mais próximo do grupo e parece saber encarar com profissionalismo o encargo. Seu Laercio preenche muito bem as cenas e além de sua forte presença, consegue dar organicidade e vigor ao papel.
                                           Para 2019, vários espetáculos estão sendo preparados pela ESMATE, Tem chorume no quintal, foi a primeira e abriu a temporada com chave de ouro.

                                                                                           Cléber Lorenzoni




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