822- Lili Inventa o Mundo (tomo 108)

Por que teatro?

Sempre que vou ao teatro, me questiono qual o motivo pelo qual determinado grupo está me propondo seu trabalho. Pelo dinheiro? Nesse caso o trabalho deve ser exímio, para merecer o que me está cobrando. Pela mensagem? Nesse caso preciso compreender muito bem onde querem chegar? Pela proposta técnica ou criação estética? Nesse caso deverá haver algo novo, desafiador ou questionador. Enfim, existe um sem fim de motivos pelo qual poderiam me chamar ao teatro. 
No espetáculo de hoje, Lili Inventa o Mundo, eu me questionei a todo o instante, o do porquê eu estar ali, por que esses atores me contaram aquela historia, que aliás há muito eu já conhecia. 
Depois de muito me indagar, cheguei a conclusão que talvez o teatro tenha se tornado para o Máschara um hábito, fazer, fazer, sem mesmo saber por que... Fazer e pronto. E isso acreditem, também é um louvável motivo. O problema, se é que há um, seria o fato de que o simplesmente fazer pode tornar o trabalho tão corriqueiro que se peque pela falta de exigência. 
Não foi um dia muito bom para a velha guarda do Máschara. Embora, tenham sido eles os motivadores, e preparadores da jovem guarda do Máschara... Cléber Lorenzoni me pareceu preocupado, sua voz estava abatida, prejudicada por algo que parecia ser uma gripe. Tudo bem, atores são seres humanos, acabam por adoecer em dias de espetáculos, no entanto, a equipe poderia e deveria ter preenchido sua fragilidade no espetáculo cantando, segurando as cenas. A partner do senhor poeta esteve fraquinha também, faltou-lhe energia, tônus. Kauane precisa ir atrás do Élan, da  presença. Mas como assim presença? A ideia de que alguém possa ‘ter presença’ como uma qualidade objetivamente verdadeira, pode levantar questões sobre que tipo de qualidade esta consiste, se esta pode ser treinada ou cultivada, e para qual limite esta pode ser aprimorada pelas percepções e expectativas daqueles que a testemunham. Muito se fala sobre a "presença", ela pode advir de "n" lugares, mas algo interessante de se pensar, é através da empatia que o ator deve criar com o espectador. Esse por sua vez vai abrindo a guarda e fica cada vez mais suscetível ao que o ator propõe no decorrer do espetáculo. É aí que tudo toma uma proporção maior para a percepção do público.
Kauane tem tido uma caminhada muito interessante em Lendas da Mui Leal Cidade e mesmo uma participação louvável em Olhai os Lírios, em Lili Inventa o Mundo precisa de mais "mordida".
Clara Devi é uma jovem atriz muito instintiva, o que é ótimo, deve buscar sempre o regramento, ouvir o diretor, ser uma atriz técnica e se policiar. O instinto é ótimo, mas as vezes ele nos leva para caminhos difíceis. É preciso respirar sobre o palco, sentir tudo a seu redor, triangular e manter viva a esfera de energia. Tudo isso se vê em Devi, basta agora canalizar. Tanto ela quanto Renato Casagrande pecaram ao abrir espaço para um público tão pequeno, que não tem o hábito de ver teatro, e acaba pensando que deve participar, gritar, rir, opinar. Mas essa situação ainda que perigosa é boa de se ver, é ela que vai acrescentar mais bagagem aos atores. 
Ainda no elenco estreante, Maria Antonia Silveira Netto foi inserida na cena com tanta graça e delicadeza que toda a audiência quedou-se. Talvez um pouco mais de força na impostação teria deixado Maria ainda mais intensa na cena. Alessandra Souza esteve intensa, viva, mas me confundiu um pouco a confusão de figurinos que usou. Não sei de quem foi a proposta, mas ela mais atrapalhou do que mostrou algo. Alessandra Souza é como já disse várias vezes uma atriz muito técnica, falta-lhe o instinto.
O espetáculo não foi apresentado com o clima poderoso que vi há três  anos atrás na Matinê do Máschara, mas tem tudo para manter-se vivo emocionando e envolvendo.

Felipe Padilha - Dedicar-se sempre, buscar conhecimento, merecer estar no palco, ser discreto quando em contra-regragem. (**)
Kauane Silva - Buscar mais vigor no palco, lutar e desafiar-se sempre. (**)
Maria Antonia Silveira Netto - Estudar, estudar, estudar. (***)
Clara Devi- Estudar, ouvir, aceitar. (***)
Alessandra Souza - Estar atenta sempre, tridimensionalmente, harmoniosamente, cuidando dos colegas e dos figurinos. Não basta dizer "quero o teatro", é preciso estar aberta e "ser o teatro" (*)
Renato Casagrande - Dividir, ouvir, somar, não perder a HUMILDADE, tudo o que sabemos no teatro, se esvai muito depressa e dependendo do olhar, pode significar nada... Aprender a ouvir e receber nãos (*)
Cléber Lorenzoni - Manter-se firme, sem sua voz, não há voz, como vimos nessa apresentação. (**)


Arte é Vida


Comentários