Resenha crítica após pesquisa sobre os dramaturgos Racine, Corneille e Molière e seus aspectos em comum.



Sobre humanismos e realismos

            Falar aqui de Jean Baptiste Racine, Pierre Corneille e Jean Baptiste Poquelin (Molière) e seus aspectos em comum é um grande desafio. À primeira vista as semelhanças são óbvias. E em profundidade? O que encontramos nas entrelinhas de suas histórias? Buscarei resumir um pouco do que encontrei e do que me instiga a buscar mais.
            Comecemos, então, pelo óbvio. Estes três nomes representam clássicos da dramaturgia francesa. Contemporâneos (sec. XVII), tiveram seus caminhos entrecruzados. Foram mestres de sua arte. São referências até hoje. Por isso, clássicos; por isso, grandes.
            Corneille é considerado o pai da tragédia francesa (embora também tenha se aventurado pelas comédias na primeira fase de sua carreira). Sua força ganhou até um adjetivo: corneliano, com uma ampla significação, fazendo referência a vontade, heroísmo, densidade literária, grandeza da alma, integridade e oposição irredutível aos pontos de vista.
            Já Molière é reconhecido como fundador indireto da Comèdie-Française. Dedicou-se à dramaturgia e à atuação. Mesmo tendo preferência pelas tragédias, tornou-se famoso por suas farsas.
            Racine triunfou com suas tragédias. Foi considerado o criador moderno de tragédias míticas (fortemente influenciado por Eurípides). Ao contrário de Corneille, que celebrava a força do homem, Racine, da ordem e sensibilidade, dramatizava a fraqueza, apontava a trágica vitória da paixão sobre a razão. De uma maneira diferente Molière também apontava para as falhas humanas: voraz crítico da hipocrisia através de suas sátiras.
            Além de conterrâneos, contemporâneos e grandes clássicos da dramaturgia, em que mais convergem esses autores?
            Curiosamente os três tiveram formação católica. Molière e Corneille de influência jesuítica, Racini de influência do jansenismo. Curiosamente, também, acredita-se que os três estudaram direito. Todos tinham muito a dizer sobre moral, justiça e a natureza humana.
            Suas obras estão calcadas no universo plausível da sociedade de sua época e na dimensão humana dos acontecimentos. Os aspectos do ser humano: as emoções e estados psicológicos das personagens, os diferentes tipos de personalidade e comportamento interessam mais que a ação em si.
            Outro ponto em comum era o apoio do rei Luis XIV. Mais do que uma característica “coincidente”, é um retrato da realidade político-cultural da época. Os teatros eram feitos para os reis, as personagens eram representantes da nobreza (em sua maioria) e, portanto, os artistas eram apadrinhados e patrocinados por reis e nobres.
            Defensores de seus pontos de vista e críticos da sociedade e do comportamento dos homens, Racine, Corneille e Molière foram alvos de críticas e censuras. A proteção do rei, nesses casos, os ajudou.
            Como clássicos, esses grandes escritores foram imortalizados. Ironicamente, antes de tornarem-se imortais, todos têm de ter um fim. É como se a morte fosse o caminho para transcender.
            Racine, que acreditava que o homem, por si só, era incapaz do bem; que possuía um temperamento dramático e uma estranha perturbação do espírito, deixou-se levar por sua vaidade, acreditando poder ocupar a posição de ministro do Estado. Sua reinvindicação foi negada, seu orgulho foi ferido ao ser expulso da corte de Luis XIV, adoeceu de humilhação e morreu. Escreveu em sua própria história a tragédia da qual sempre falou.
            Corneille, que triunfou falando de força e heroísmo, teve sua obra ofuscada por Racine. No fim da vida encontrava-se tão mal que passou a receber pensão do rei. Antes de ser imortalizado como herói da dramaturgia francesa, saiu de cena sem grandes aplausos, em declínio.
            E, por falar em sair de cena, dizem que Molière retirou-se da vida em cena. Desmaiou no palco, encenando um falso doente e, poucas horas depois, deu seu último suspiro.
            Ainda em vida Racine e Molière deixaram de se falar. Curioso que, mesmo contrários um ao outro, muito disseram em comum.
            Essas vidas e mentes interessantes, com certeza, têm muito mais a contar através de suas obras. Há um mundo (ou muitos mundos) a desvender. Um mundo (ou muitos) humanista e realista, vivido, contado, descrito, escrito e imortalizado por Jean Baptiste Racine, Pierre Corneille e Jean Baptiste Poquelin (Molière).
            Ouso dizer, ainda, que esses três têm mais uma característica em comum: instigaram-me a pensar, a “curiosar” e a amar ainda mais a arte de “teatrar”.


Raquel Arigony Prates

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