Depoimento sobra e oficina ministrada por Raquel Arigony Prates


Os acordes do corpo e os mil caminhos a serem galgados por um artista em busca da compreensão de seus movimentos. – Sistema LABAN/BARTENIEFF  através da pesquisadora Raquel Arigony Prates.

 

                Seis encontros para se mergulhar nos ilimitados viesses do palavreado corpóreo, pode parecer muito para quem vê o irmão corpo como um amontado de músculos, ossos e cartilagens. No entanto para quem compreende ou ao menos questiona-se quanto a pluralidade desse misterioso equipamento de comunicação, de troca, e de efervescência, seis noites para visualizar a consciência corporal em cada entroncamento é apenas um ponta pé, o inicio de uma motivação muito maior.

Como ator, debato-me sempre naquilo que busco enquanto comunicador, nas possibilidades que tenho a minha disposição. “Segundo Barba, a antropologia Teatral é o estudo do comportamento humano quando o ator usa sua presença física e mental em uma situação organizada de representação de acordo com os princípios que são diferentes dos usados na vida cotidiana”.  Enquanto diretor, essa premissa de Barba sempre me acompanhou e isso encontra eco na caminhada proposta pela oficineira Raquel Prates, que não mediu esforços para abrir portas, apresentar chaves, lançar interrogações e levantar questões em nosso cérebro que respingavam em nossos músculos e articulações.

Durante nosso mergulho por uma Labananálise, Raquel nos revelou gotas generosas dos “Fundamentos Corporais Bartenieff”: qualidades de movimento, formas cristalizadas, a eucinética e ainda diálogos acalorados de “dentro para fora”. Obviamente esse muito adquirido é pouco quando voltamos nosso olhar para as extensas pesquisas de Rudolf Van Laban. Tentamos desmistificar juntos, o retrógrado pensamento enraizado em alguns de nós, de que dança e teatro sejam caminhadas distintas, talvez a dança seja um teatro sem falas. Ora, o mundo contemporâneo carrega consigo um contexto diferenciado no que tange a área das artes, as circunstâncias históricas, sociais e estéticas, conferem ao artista-cênico, uma postura versátil, diversificada e ousada. O artista do século XXI não se contenta em levar ao palco um obra básica, restrita, pelo contrário, ele se nutre das mais variadas formas de interação, matizes e técnicas. Para isso ele busca em Barba, Meyerhold, Decroux entre tantos outros, suas versáteis análises do pensar cênico.

Raquel Prates elenca alguns exercícios para ir nos dissecando e nos propõe um olhar para o interno e também para o externo. Tudo é feito com calma, respeito ao tempo de cada aluno e principalmente de forma a não saturar nossa mente. As propostas vão fluindo em meio a eloquentes diálogos que aludem e informam.

No primeiro encontro os sentidos são despertados de forma a ficarmos ligados, prontos à tudo o que iremos receber de fora para dentro. Ultrapassada essa primeira fase, chegamos ao Espaço Tridimensional ao Redor do Corpo, ou seja, nossa Cinesfera.

Nossa vivencia teatral adaptou rapidamente, desenvolveu caminhos, indagações e reações nesse primeiro estudo e o mais interessante foi encontrar em nossas cinesferas, muito de nossa vaidade. Ou seja, somos um único ser, que se comunica, reage, cria de acordo com um todo.

Nas qualidades dinâmicas, o jogo teatral falou muito alto e variamos entre pesos e intenções. A oficineira nos proporcionou criar, desenvolver coreografias e mostrou-se sempre sensível as dificuldades e espontaneidades de cada individuo. A seguir, Fluxo, Camadas e Forma. Uma busca por algo novo, por um gesto, por uma inspiração, pela descoberta do genuíno e do autêntico.

Os aprofundamentos propiciados pela pesquisa e conhecimento de Raquel Prates encontraram sim barreiras, nossos corpos, ainda que atuantes, desenvolvem como todos os corpos, vícios e robotizações. É preciso sensibilidade, curiosidade, vontade e por que não dizer, humildade.

Ao fim dessa primeira etapa, a percepção de que a observação junto as linhas e formas do nosso existir em meio ao espaço, promovem uma consciência de nossas possibilidades motoras e psíquicas, torna-se a maior conquista. No plano artístico, ela gera uma maior conexão com nosso “eu” interior, e elenca um artista ainda mais preparado para o exercício da comunicação.

 

 

 Cléber Lorenzoni – Diretor de Teatro

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