Complexo de Elecktra tomo 6

Teatro para quem o quer...

         Não adianta impor o teatro, não adianta obrigar as pessoas, esfregar na cara delas a sua arte. O teatro tem que estar ali, a disposição, a distancia de uma pernada; Para que quando precisemos dele, saibamos la chegar. Teatros são como templos, quase sempre você só lembra dele quando precisa. 
             "O teatro te alarga a alma", ouvi essa frase há muito tempo, pronunciada por uma grande mestra. E a cada apresentação, a cada espetáculo, percebo em meus colegas/alunos o quanto essa frase possui embasamento. Quando saímos do templo teatral levamos conosco algo novo, um olhar espaçoso sobre as coisas. As vezes quando chego em casa após assistir um espetáculo, sinto uma vontade louca de abraçar meus netos e ficar um tempo agradecendo por termos uma filha acolhedora e fraternal. Isso me faz valorizá-los ainda mais. As vezes, quando saio do teatro, fico mais irritada com os políticos e penso em fazer algo, mudar as coisas. As vezes quando saio do teatro, sinto um calor diferente, e me pergunto, por que pensam que somente os jovens sentem desejo sexual. Enfim, o teatro me faz questionar, me faz sorrir, me faz chorar, me faz ver coisas que sozinha não vejo. 
             Em Complexo de Elecktra há um clima de eferverscência, um impacto movido por questões fortes de maternidade, matricídio, incesto. Costumes e princípios que a sociedade há séculos organizou como melhor lhe convinha para que a dita civilização vivesse melhor. Mas e quando há um crime, quando há um rompimento nessa organização, o que penso sobre isso? Não sei, na maioria das vezes não queremos pensar... Temos preguiça de pensar. Constantemente pergunto a pessoas que me cercam, seus pontos de vista quanto à determinados assuntos, e me choca quando dizem: "Nunca pensei a respeito disso."
              O teatro trágico é interpretado por atores que em um momento assumem posturas de semideuses, conseguem fazer coisas que nosso senso moral não permite, mas que estão ainda no fundo de nossos DNAs, heranças de uma época remota em que fomos mais "animais" do que somos hoje, ou menos... Eis um novo paradoxo... O público que observa a cena sabe que nunca teria coragem de praticar as ações das personagens. No mundo helênico os deuses se levantariam contra a prática desses personagens assassinos vingativos, hoje em dia a sociedade é que os lincharia. Medeias, Creontes, Édipos, Electras, todos eles, hoje em dia quando aparecem são levados rapidamente para presídios e separados da sociedade. Mas e seus sentimentos? São inferiores aos nossos? Somos melhores apenas por que escondemos ou escamoteamos pensamentos ditos cruéis ou psicopáticos? 
                   Na cena de domingo a noite, mais uma iniciativa linda do Máschara (O TEATRO NÃO PODE SER VENCIDO). Os atroes Alessandra Souza e Cléber Lorenzoni promoveram outro embate gostoso de ver, forte, agressivo, cheio de equilíbrios e desiquilíbrios. Eu particularmente começo odiando Ereda, então assisto a cena de Ulrica com Bertold e tomo as dores da filha. Logo depois volto a odiá-la pela forma como tortura aqula mulher que apenas quis amar, e então volto a ter raiva de Ulrica quando ela e o tio levam ao pico sua frieza... Mas ao final, confesso-me prostrada, não sei o que pensar. Eis o trágico. Quando você reconhece naquelas personagens uma capacidade sobre humana de suportar as suas dores. Eu por exemplo tinha me jogado no tal riacho da ponte, muito antes da volta de Henrique. 
                     Acredito que seria ainda melhor se os interpretes nos brindassem com um pouco mais de sussurros, mais mistérios em suas falas. Entrega-se tudo muito fácil em Complexo de Elecktra. Apenas Ulrica traz consigo um olhar, um mistério... A própria Ereda pode nos dar mais duvida. Quando a platéia sobe para a cena da despensa, ainda não sabemos que a mãe ajudou Bertold no tal assassinato. Então esse ódio pode ser ainda mais direcionado apenas à Bertold, para que tenhamos maior surpresa, choque, na cena em que se revela o assassinato. 
                        O ator interprete de Werner esteve bem, com domínio de suas falas, precisa apenas ter cuidado para não machucar as cordas vocais em seus gritos na cena pós bife de Ereda.  
                      Evaldo Goulart mantém um bom ritmo, mas nessa ultima apresentação se perdeu algumas vezes, o que fez uma das cenas perder o ritmo, bem como Raquel Arigony que pode acelerar um pouco. Seu oráculo precisa ser mais assustador para Ulrica e por isso precisa falar mais rápido seus textos, com mais explosões. 
                           A entrada de Ulrica na banheira deixou a cena muito mais intensa, mas falta chegar a algo... Gabriel esteve muito inteiro e pode ainda se dedicar mais. Falta as vezes humildade em alguns atores. Ser bom em um festival ou ganhar um elogio no outro, não nos torna melhores que ninguém, nem nos caracteriza PHDs em nada. O teatro é algo feito para o outro, o outro, o outro, sempre o outro. E por isso precisamos baixar nossa cabeça e ouvirmos o outro!
                          Complexo de Elecktra é o espetáculo mais ousado do Máschara, pode também se tornar o melhor...


Arte é Vida


                    A Rainha



Alessandra Souza (**)  
Renato Casagrande (***)
Cléber Lorenzoni (***)
Douglas Maldaner (**)
Evaldo Goulart (**)
Raquel Arigony (**)
Gabriel Araújo (***)

                  

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