segunda-feira, 27 de outubro de 2025

1287- O Incidente (tomo 95)

           "Aquilo que pode salvar uma comunidade, acaba sucumbindo pelos interesses políticos de uma minoria corrupta."


                     Vamos tentar analisar o espetáculo O Incidente através do público, foi o que tentei fazer durante os cinquenta minutos de espetáculo. Os coretos, infelizmente saíram de moda, restaram claro, palanques oficiais, mas que ocasião melhor para reunir voluntários e  patronesses, do que uma feira de livros? Campo Bom apresentou uma grande estrutura para sua feira, e ainda recebeu os artistas com uma retreta, que entoava canções dos anos 80. Havia sim um representante da prefeitura envolvido na organização, mas certamente nenhum político na plateia. Eles são de exatas suponho, dificilmente de humanas. Na primeira fila, uma bufa, com um bebê nos braços, assistia muito interessada ao espetáculo, certamente era quem mais poderia compreender as camadas sobrepostas pela sagacidade de Erico Verissimo. Não por ser estudada ou culta, mas certamente pela vivência tão próxima das dores inflamadas nas personagens de Pudim e Erotildes. Aquela mulher empurrando um carrinho de supermercado com um menino doente dentro, era a verdadeira metáfora da vida humana capitalista. Quando Menandro tombou após seu bife, ela levou rapidamente a mão ao peito. 

                          O espaço da rua coberta, no inicio com menos de quinze pessoas, foi aos poucos sendo preenchido, possivelmente por que gritos e contorcimentos  do grupo de "zumbis" era a coisa mais intensa naquela tarde abafada. Era a verdadeira praça de Antares. Assim como na cidade fictícia, boa parte da turba, havia se reunido sem entender nada do que acontecia, ali também ocorriam todo o tipo de situações para disputar a atenção do público. Vendedores de livros, escritores esfaimados por vender suas obras, uma mãe que tentava ninar o filho que não parava de chorar, um casal conduzindo um cãozinho que lhes escapou exatamente na cena de Erotildes, um grupo de adolescentes preocupado em organizar uma mesa de certificados, e claro, uma fotógrafa que parecia não perceber o espetáculo acontecendo, apenas a tal mesa de certificados. 

                             Ao fundo, com olhar inexpressivo, o organizador daquela parte do evento, observava, um pouco o palco, um pouco a feira. Talvez no fundo, torcesse que o público se interessasse, afinal, havia apostado suas fichas no espetáculo. Em meio ao cenário dantesco, e ao clima sufocante, de um calor de quase trinta e três graus, aconteceu um sagrado momento teatral. Oito pessoas, abrindo mão de seu existir por cinquenta minutos, para que criaturas, advindas da mente de um autor e de um diretor, tomassem espaço na narrativa existencial daquela tarde. Suas dores, suas culpas, suas vidas, foram sendo expostas, enquanto a vida seguia se curso, meio desorganizada, e com a estética transloucada do dia a dia. Os escritores de Campo Bom, reuniram-se lá no fundo, de costas para o palco e felizes, fizeram um retrato, aquéns do que acontecia no palco, devem ter levado a imagem dos mortos de Antares, ao fundo de sua foto, mesmo sem querer. 

                            Lorenzoni levantou a voz, Casagrande se esforçou, Lemes engoliu uma fala ou outra, Erotildes acelerou um pouco o ritmo, Devi embolou um pouco as palavras, La Jorge engoliu algumas marcas e Ben e Flores lutaram para manter a energia. Entre uma tentativa e outro de curva, um murmurinho aqui e acolá. O som titubeando entre alto e baixo meio desritmado e finalmente uma fala do diretor, para contextualizar.

                                Oscar Wilde, sempre disse que há dois elencos, dois elencos que saem de casa para promover o fenômeno teatral. O elenco treinado, sobe ao palco ensaiado, o elenco de público, veio em busca da catarse, mas não ensaia. Improvisa. E nesse dia faltou jogo, faltou decoro, faltou comprometimento. 

                   -É triste, perceber   que a arte é   tão pouca coisa, tão desnecessária Dona Quitéria.

                        -E o que o Senhor sugere Dr. Cícero?

                     - Que pensemos duas vezes, sobre quem merece ver nosso trabalho, ou então, que nos debrucemos com mais ímpeto sobre o fazer teatral. Algo há de sair disso...

                        Parabéns aos artistas que ainda lutam, que acreditam, que fazem, são eco, que outros seguem, são alicerces para a arte continuar firme, transformando o mundo.

  O melhor : O esforço do ator Renato Casagrande em seguir o espetáculo, mesmo não estando se sentindo bem.

   O pior: A falta de ensaios, que causou uma apresentação repleta de pequenos erros.




   O Incidente - roteiro adaptado da obra e direção de Cléber Lorenzoni

Elenco original- Dulce Jorge e Cléber Lorenzoni

Elenco em substituição - Renato Casagrande 5º Menandro Olinda, Clara Devi 6ª Shirley, Antonia Serquevitio 4ª Erotildes, Junior Lemes 5º Barcelona, Cleberson Ben 7º João Paz, Didy Flores 6º Pudim.

Equipe técnica - Roberta Teixeira e Ana Clara Kraemer



                               Nós passamos, o teatro fica!!!

                          

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