834 - Complexo de Elecktra (tomo 14)

Noite de tragédia 


O que é a tragédia grega, e qual sua função?
Talvez o fato de não se falar mais dos princípios da tragédia, talvez por não se falar de catarse ou mesmo por se compreender tão pouco sobre o universo da tragédia tenhamos perdido a mesma pelo caminho. Isso explica o porque de termos quase ninguém nas plateias de espetáculos intensos, dramáticos, trágicos. A tragédia não ficou obsoleta, mas talvez, esteja morrendo, o universo atual não tem tempo para analisar o porque o instinto humano eleva-se à extremos. Queremos apenas expurgar da sociedade os vilões, sem compreendê-los. 
O sacrifico do bode, oferecido à Dionísio, não passa de historia. E as pessoas odeiam historia, não se dão conta de que somos feitos de historia, mais até do que ciência, afinal tudo o que somos, nossos pais, a origem de nossas doenças, tudo é explicado pela historia. 
A tragédia grega tem o poder de assumir as capacidades humanas, aquelas das quais nos envergonhamos. 
Euripides e Sófocles são homens que ficaram no tempo, ancestrais que contaram tramas incríveis. Talvez eu esteja ultrapassada, talvez o quadradinho ou o funck ou sei lá o que seja a realidade atual. Talvez uma era esteja prestes a se acabar, talvez o teatro do Máschara possa se adaptar ao mundo novo. Talvez o Máschara seja o último refugio onde se ouse falar do homem em sua profundidade. 
Sófocles e Eurípides falaram de Elecktra,  o segundo influenciado por ideias sofistas tratou do tema com certa piedade, Eurípides trata Electra sempre como uma mulher histérica e egoísta, quase desequilibrada pela ideia do matricídio. Orestes também é um fraco, inspira piedade, precisa ser forçado pela irmã à vingar a morte do pai. Alessandra Souza e Renato Casagrande constroem bons pseudo-protagonistas. Ele com seu tempo de teatro e com sua capacidade de criar tipos, estrutura um ótimo irmão mais novo. Alessandra Souza está em sua melhor investida no palco. Nem sua Olivia ou qualquer outra personagem que já tenha feito tem a relíquia de trejeitos, ou filigranas de Ereda. 
A sexualidade confusa das duas personagens, dignas de estudos, encontra eco na direção e no texto de Bender. Gabriel Giacomini completa essa relação ambígua com a composição que deu ao personagem do seminarista outrora envolto em névoas. 
Fábio Novello, como deuteragonista faz tudo direitinho, embora Novello tenha muito a arrancar de seu Bertold. Cléber Lorenzoni é um furacão em cena, e o vi tão triste com os acontecimentos do dia , que me questionei do por quê se entregar tanto. Nunca conheci um ator tão passional em cena no Máschara. Um prazer à nós platéia. 
O Camponês, noivo de Ereda, aqui interpretado por Douglas Maldaner, alcançou bons resultados e foi para mim o sucesso da noite. Houve ainda a substituição de Raquel Arigony pela madura interprete Dulce Jorge. Uma mudança. Uma construção nova. Para mim um acerto da direção que concebeu a personagem e um mérito da atriz que encarnou o papel. Uma velha crível, que assusta Ulrica e prediz o seu destino. Distante do divino, a velha de Dulce Jorge usa a hereditariedade como motivo do que se seguirá. 
Cléber Lorenzoni e seu séquito de atores lutam, lutam pelo estilo, pela estética, pela ética teatral. Deveriam levar complexo a um festival de teatro, onde atores deviam assistir ao trabalho. Faz-se coisas tão incríveis nas catacumbas do teatro cruzaltense, pena o teatro ter valor tão pequeno. 


                                             Arte é vida


Douglas MAldaner (***)
Clara Devi (**)
Kauane Slva (**)
Gabriel Giacomini (**)

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