IXª edição do Complexo de Elecktra - 739

                    
Não da para exigir reações...ou da para exigir as reações...?



               Quando falamos em adaptação, muitas vezes pensamos o seguinte: determinada pessoa pegou um texto, foi extirpando trechos e o que sobrou, ou o que conseguiu manter, jogou sobre o palco. Não, definitivamente esta é uma visão equivocada do trabalho de adaptação de um dramaturgo. Sim, chamo-o assim, pois o adaptador precisa ter um extensa noção de carpintaria teatral, boas noções de direção, compreensão de curva dramática, e etc...
                  Na adaptação feita por Ivo Bender a partir  de Eurípides, o autor pretendia falar de algo, algo que não é o que o Máschara pretende falar. Em Bender faz-se alusão a grande enchente de 1941, à colônia alemã. Cléber mantém parte disso, no entanto, traz ao pico o tema do complexo e para isso, faz uso de cenas bastante fortes.  Lorenzoni, influenciado pelo contemporâneo a sua volta, faz a  obra caminhar meio como Eugene O’Neill em sua Mourning Becomes Electra. Vê-se nessa histérica Electra um olhar froidiano que felizmente não há nas tragédias gregas, logicamente. O tema universal continua presente, a justiça, no entanto o olhar sobre a vingança mudou. Os gregos de uma Atenas repleta de atos tão bárbaros, aceitavam a vingança, o que acrescia à Electra uma certa razão. O’Neill segue os passos de Eurípides, distanciando-se da religiosidade e da força do divino, enquanto Lorenzoni e Bender seguem pelo olhar de Sófocles. A grandeza é enfraquecida por O’Neill em sua Lavínia, já que ali a heroína não é mais filha de um rei. Em Sófocles todas as personagens pertencem a uma grande dinastia famosa. Agamêmnon é o rei, sua esposa Clitemnestra é a rainha, e os príncipes de direito Electra e Orestes. Isso lhes concede grandeza, nobreza de sentimentos inata e princípios morais altíssimos.  Em O’Neill, o general Mannon é prefeito, em Bender e Lorenzoni, um fazendeiro. A grandeza aqui está na plástica, no porte de cada composição cênica. Os medos impostos pela religião, tem agora, em meio ao mundo moderno, a força do biológico. “Um dia verás que somos iguais Ereda”. Mãe e filha, genética e sangue.
                   Em meio há tantos olhares, sinto falta de compreender perfeitamente qual é o olhar do Máschara. Há uma rixa interna que me faz ver muito forte o texto de Bender. Se essa for a opção não há problemas, mas é preciso assumi-la. O que de certa forma, já não é mais o caso, principalmente por que agora temos três cenas totalmente diferentes da proposta do escritor porto alegrense.  Ora, Bender escreveu um texto realista/regionalista. O Máschara conceituou-o de forma expressionista.
                E esse expressionismo é um logradouro pouco visitado pela população de uma cidade onde o costume de ir ao teatro é algo novo. Nessa tragédia não há o descanso cômico entre as cenas como em tantas outras. Pelo contrário, a tenção e de certa forma o terror, é buscado continuamente. Sendo assim a plateia não pode relaxar suas tenções. Há portanto duas saídas, manter-se tenso até o final, ou reagir a sua maneira no decorrer da ação. Claro que não se dará esse tipo de reação por exemplo em uma apresentação de musica erudita. E por que? Ora, por que no teatro o homem entra em contato com a multifacetada variante de emoções. O teatro possui uma força poderosa, perigosa. O mágico da noite de domingo é que esse poder e esse perigo mostrou-se de forma assustadora também  para os atores.  
               Por que mesmo estabeleceu-se a noção de “quarta parede”? Não serviria ela de proteção? Atores inflamados pelo ódio, colocam em risco o seu trabalho e o trabalho dos colegas. Por exemplo quando ouvi a frase: “Quem mata o amante, não sede nem mesmo ante os próprios filhos”.  Que amante? Quem matou o amante? Isso sem falar nos “vocês” e “tus” tão misturados. 
                      O ator é um profissional paradoxal. Ele inicia a manhã dizendo que faz teatro por amor, por volta das dez da manhã precisa que lhe chamem a atenção ou não produzirá o esperado. No começo da tarde diz que está ali por si mesmo e que não depende do público, já por volta das cinco reclama que os ingressos não foram vendidos e teme a ausência da plateia. Às sete da noite desentende-se com o colega que lhe da um conselho para melhorar a cena e por volta das nove curva-se humildemente sob o aplauso da plateia. Agradece feliz e parece amar há todos.  Ousa dizer ao diretor na saída que a cena é sua e que prefere fazer a seu modo e indo para casa mais tarde percebe que não tem um único tostão no bolso.
                     Humildade senhores, humildade, pois por artistas, serão a vida inteira dependentes dos outros. Leitura e conhecimento para que não sejam nunca dominados, para que sua arte seja alicerçada em uma chancela de sabedoria.

Arte é Vida



                    A Rainha


Alessandra Souza (**)
Raquel Prates (***)
Renato Casagrande (***)
Evaldo Goulart (**)
Gabriel Giacomini (***)
Douglas Maldaner (**)
Cléber Lorenzoni (***)


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